quinta-feira, 7 de julho de 2016

Base Aérea de Dijon, o fim de uma lenda operacional.

Uma base que realmente tem "história pra contar", histórias que envolvem franceses e brasileiros também. Hoje dia 07 de julho de 2016 a mesma festejaria seus 103 anos se não fosse pela desativação oficial.
Foto via Museu da BA-102 Dijon-Longvic via France Bleu.

Por Yam Wanders



Base Aérienne 102-Dijon-Longvic "Capitaine Georges Guynemer", ou para os lusófonos apenas Base aérea de Dijon, a base aérea francesa que virou uma lenda viva na aviação de caça européia e também para brasileiros fechou suas portas nesse dia 30 de junho de 2016 após 102 anos de operação, com a merecida menção honrosa da participação em duas guerras mundiais, na guerra fria ocidente X Pacto de Varsóvia e pela formação de milhares de aviadores pilotos do famoso Dassault Mirage em suas várias séries e versões. 

Nessa matéria descreveremos um pouco da história de uma das mais importantes bases da Armée de l'Air (Força Aérea Francesa) e o que ela representou não só para franceses como para brasileiros, entre outros. A base festejaria seus 103 anos hoje se não fosse pela sua desativação.

Imagens da solenidade com a presença do Cmdte da Armée de l'Air .
Créditos de imagem journal "Le Bién Public-Dijon".
A Missão principal a base foi prover a defesa do espaço aéreo da França bem como abrigar diversas outras unidades que não só a aviação de caça mas também

Veteranos vieram de todos os cantos da França para a cerimônia.
Créditos da imagem journal "Le Bién Public-Dijon"
uma unidade de commandos paraquedistas ( Commando Parachutiste de l'Air n°20) bem como sua escola de formação, uma unidade da Séctión Aeriénne de  Gendarmerie de l"Air  e as respectiva 

Considerada pelo público da aviação militar como uma das cerimônias
mais emocionantes dos últimos tempos.
Crédito da imagem journal "Le Bién Public-Dijon".
unidade do l'Èscadron 1/2 "Cigognes", 2/2 "Côte-d'Or e o Estado Maior do Commandement des Forces Aériennes, unidades estas todas já transferidas para outras bases nos últimos anos. 
Para o momento presente a base abrigará apenas as instalações de vigilância radar e controle de tráfego aéreo, um centro de arquivo e documentação, um pequeno contingente de segurança e para o futuro oficialmente já se prepara as instalações para uma escola de formação básica da Gendarmerie (Polícia Militar francesa). Especula-se  o interesse de uma empresa canadense que trabalha com manutenção aeronáutica em adquirir os hangares e também a possibilidade do Breitling Jet Team com seus jatos Albratos aero L-39 ocupar alguma instalação no local. Para uma base que mantinha em torno de 2.500 militares e em algumas épocas até mil militares de trânsito, o impacto econômico para o comércio local será de grande vulto, outras informações de veículos oficiais locais dão conta de uma despesa de mais de 6 milhões de euros em custos para a desativação da base.


Foto da BA-102. Imagem via Journal "Le Bién Public-Dijon".


O então Subtenente Georges Guynemer, durante a sua apresentação da bandeira de aviação para a tropa durante a 1a Guerra Mundial em uma formatura de entrega de medalhas. Anos mais tarde seu nome daria ainda mais status a BA-102 com a consideração do mesmo como patrono da base. Foto via Museu da BA-102 Dijon-Longvic.

Um pouco de história

Escrever sobre uma base centenária não é algo simples, toda base aérea geralmente já tem alguma história antes mesmo do começo de qualquer operação militar, e, sendo assim ocuparia um espaço desmedido em qualquer obra. 
Em algumas pesquisas superficiais já encontra-se fatos e imagens muito interessantes sobre a BA 102.
Em 1910 no mês de setembro entre os dias 22 e 25, uma suntuosa festa aviatória foi organizada na cidade de Dijon, e o evento impressionou tanto as autoridades do então Ministério da Guerra que decidiram construir um aeroporto na cidade para abrigar a aviação que estava já se mostrando útil para seus diversos fins militares. No dia 7 de julho de 1913, as comunidades de Ouges e de Longvic cedem um terreno de 9 hectares entre as vilas para a requisição de utilidade pública da construção da futura base.
Na primavera de 1914 a base já estava operacional já com hangares e casernas para as tropas e também com um esquadrão já formado junto ao centro do 1° grupo de aviação e quando começa a 1a guerra mundial a base já contava com quatro esquadrilhas prontas, uma escola de aviação e um depósito de aeronaves novas junto a um centro logístico militar.
Em 1916 surge nessa base a tradição da bandeira militar de aviação, que é apresentada à tropas do 1° grupo de aviação da base pelo então subtenente Georges Guynemer, que mais tarde seria considerado o patrono da Base Aérienne 102.
Durante os anos entre guerras, a base divide espaço com a aviação civil vindo a ser um importante aeroporto principalmente para as linhas aéreas que ligavam a França ao norte da Africa e abrigando uma escola de aviação civil.



Rara foto de um dos massivos bombardeiros
da BA-102 pela USAF durante
a 2a Guerra Mundial. 
Foto via Museu da BA-102 Dijon-Longvic.
Durante a 2a Guerra Mundial a base foi alvo incessante dos bombardeios da Luftwaffe que a deixaram bastante avariada durante os meses de maio à junho de 1940 até a sua ocupação pelas tropas alemãs, vindo a se tornar uma das principais bases da Luftwaffe em territórios ocupados. A base também sofreria novamente com os bombardeios da USAF a partir de 1943 até 1944 até a expulsão das tropas alemãs do território francês. Logo após a opucação da base pelas forças americanas, estabelece-se nela dois grupos de bombardeiros da USAF que utilizavam B-26 Marauders.
Nos anos 30 a base testemunha a criação da famosa "Patrouille Weisser", a primeira esquadrilha acrobática da França, que seria a inspiração para a formação de outros esquadrões de demonstração que serviriam de base para a formação da moderna Patrouille de France. Foto via Museu da BA-102 Dijon-Longvic.
Caças De Havillad 100 "Vampire", os primeiros jatos operacionais de uso da Armée de l'Air tiveram seu "debut" na Base Aérea de Dijon-Longvic em 1953.
 
Foto via Museu da BA-102 Dijon-Longvic.
Poucos sabem mas logo após a criação da "Patrouille de France" em 1957, o seu primeiro lar foi a Base Aérea de Dijon-Longvic.
 
Foto via Museu da BA-102 Dijon-Longvic.
Após a guerra e com grande parte de sua reconstrução permitindo a operação de aeronaves mais modernas, a base recebe em 1949 a missão de ser o centro da defesa aérea da França e também um centro de formação de aviação de caça, sendo assim recebe o primeiro esquadrão de caças a reação da história da aviação francesa com as aeronaves De Havilland 100 Vampire. 
Nos anos seguintes recebe os primeiros esquadrões dotados de aeronaves de fabricação francesa da Dassault a partir de 1953, sendo sucessivamente o MD 450 Ouragan, o Mystére IV A em 1956, o Mirage III em 1961, o Mirage III E em 1968, o Mirage 2000 C em 1984 e o Mirage 2000 5-F (equipados com o radar RDY) em 1999, o que na época tornou a BA-102 a ser a única base da Europa a dispor de um interceptador dotado de um radar para múltiplos alvos dos mais modernos do mundo.
Primeira base a operar os Mirages III em 1961 e também a ser um centro de desenvolvimentos e testes de equipamentos de vôo para grandes altitudes para
uso dos pilotos. 
Foto via Museu da BA-102 Dijon-Longvic.
Em 1984 a base recebe os primeiros Mirages 2000 C.
Foto via Museu da BA-102 Dijon-Longvic.
Caroline Aigle, a primeira mulher a voar um Mirage 2000C teve como lar operacional a BA-102.
Foto via Museu da BA-102 Dijon-Longvic.
A BA-102 tem um excelente aproveitamento do terreno, e, nesse caso com o plantio de vinhas que produzem uma das melhores uvas da França para a produção de vinhos exclusivos para a base.
Foto via Museu da BA-102 Dijon-Longvic.
A BA-102 foi também o  lar dos treinadores Alpha-Jet até 2014.
Foto via Jornal "Le Bién Public-Dijon".
O Coronel Pierre Real, atual comandante a BA-102.
Histórica para brasileiros também

Para nós brasileiros, o interessante é citar sobre a importante transição da nossa aviação de caça para o uso de modernos interceptadores Mirage III EBR e III DBR, que foram adquiridos da França em maio de 1970 para a formação do 1° GDA - Grupo de Defesa Aérea, visando a defesa estratégica da capital federal do Brasil. Em 1972 a FAB designa oito pilotos para efetuarem os cursos e treinamento na França e assim nascem os chamados "Dijon Boys", um grupo selecto de aviadores brasileiros que teve a responsabilidade dessa missão que fez a nossa Força Aérea ingressar na era dos modernos interceptadores supersônicos. 
Foram eles:
  • Cel.Av. Antônio Henrique Alves dos Santos;
  • T.Cel.Av. Jorge Frederico Bins;
  • T.Cel.Av. Ivan Moacir da Frota;
  • Maj.Av. Ronald Eduardo Jaeckel;
  • Maj.Av. Ivan Von Trompowski Douat Taulois;
  • Maj.Av. Lúcio Starling de Carvalho;
  • Maj.Av. Thomas Anthony Blower; e
  • Cap.Av. José Isaias Villaça.

Na foto, três dos Dijons Boys; Colonels Ivan Von Trompowsky Douat Taulois (Jaguar 05), Thomas Anthony Blower (Jaguar 07) and José Isaías Vilaça (Jaguar 08) com seus instrutores franceses na cerimônia de despedida do Mirage III BR na base Aérea de Anápolis em 14 de dezembro de 2005.
Foto por Leandro Maldonado via Milavia.net.
No cenário da guerra fria que o mundo estava no começo dos anos 70, era de importância essencial para qualquer nação com condições, possuir interceptadores supersônicos, pois apesar da tecnologia dos mísseis intercontinentais já existir, a maior ameaça de ataques com armas nucleares ainda era oferecida por bombardeiros estratégicos ou outras aeronaves de ataque táticas. A posse e operação dos Mirages III pela FAB na época elevou muito o status do Brasil como nação soberana e capaz de projetar forças na América Latina bem como comprovou a capacidade técnica de nossa Força Aérea em manter ativos por mais de 30 anos essas aeronaves míticas em alerta operacional constante para a defesa de nosso espaço aéreo como foi comprovado em algumas vezes em alguns episódios de violação de nosso espaço aéreo e em situações de crises internas.


Algumas imagens da cerimônia de desativação da BA-102 no dia 30 de junho de 2016.














Créditos das imagens:
Musée de la Base Aérienne BA-102 "Georges Guynemer", via France Bleu.
Journal Le Bién Public de Dijon.

Georges Guynemer, héroi da França.



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