terça-feira, 26 de setembro de 2017

Tropas e marchas, o porquê de marchar!

Marcha da MARAMBEX III 2017, realizada pelos alunos Fuzileiros Navais, do curso de aperfeiçoamento de praças do CIASC.
Por: Yam Wanders.

A marcha de 24 Km é ainda um dos mais temidos exercícios para os jovens militares ainda não acostumados com a vida militar, mas, salvo raras exceções, todos um dia terão que encarar esse desafio como parte da validação de suas carreiras militares. Desde os tempos mais remotos, a marcha faz parte da vida do militar ou qualquer outro povo, que precisasse apenas "sobreviver" em um mundo onde o maior conforto era o simples fato de não ser atacado por povos inimigos ou abatido pela fome ou doenças. 



Antes da marcha, o inevitável "molhar de pés" no desembarque na praia. Imagem da MARAMBEX III 2017.

E, nas histórias de guerras dos tempos modernos, vitórias foram alcançadas e tropas inteiras salvas de fogo de artilharia, graças à movimentos de deslocamentos rapidamente organizados e concluídos por marchas que superaram entre 20 km à 40 km em campos de batalhas. A marcha também tem todo o seu significado simbólico para os exércitos, quando da saída para o combate, a finalização da tomada de uma cidade inimiga ou a liberação de uma cidade antes ocupada.

O que é uma Marcha na teoria e prática?

Na teoria,uma das definições mais modernas foi elaborada pela Dra Patrícia Deuster, autora da obra "The Navy SEAL Physical Fitness Guide", Aonde ela define a marcha militar como:

"As marchas militares, são deslocamentos de tropas que podem ser realizados a pé, em meios automóveis, por caminhos-de-ferro, meios aquáticos e pela via aérea. Estas são utilizadas quando é indispensável vencer grandes distâncias, chegar ao destino desejado em tempo oportuno e em condições eficientes para o combate . As marchas efetuam-se de dia ou de noite, descansando as tropas apenas o estritamente necessário, para que os homens possam refazer-se do desgaste produzido. Compete, ao comandante conciliar as exigências da rapidez do deslocamento com a conservação do poder combativo."

Um dos poucos momentos de pausa da marcha, a verificação de material, para que todos portem exatamente o mesmo peso e quantidade de equipamentos. Imagem da MARAMBEX III 2017.

Na prática, já entram uma miríade de fatores, que são de grande utilidade para qualquer cenário de guerra, não importando sua posição na linha do tempo da história humana. Até épocas recentes de guerras do século XX/XXI, as marchas sempre estiveram presentes no deslocamento tático e estratégico das unidades mais básicas à exércitos inteiros em avanço ou retirada de um cenário de combate e/ou ocupação de terreno. No momento em que qualquer pessoa continue a leitura desse texto, é certo que em algum lugar do mundo, em algum cenário próximo ou distante, existe uma tropa em marcha em terreno de combate.


Na verificação de material e equipamentos, nem uma bala de hortelã a mais e nem uma folha de papel a menos, tudo dentro do justo e previsto. Imagem da MARAMBEX III 2017.

Em campanha, este tipo de deslocamento tem que ser muito bem preparado, uma vez que todos os movimentos, mas especialmente as marchas, dado que elas ter-se-ão que executar muitas vezes nas proximidades imediatas do inimigo, exigem uma preparação adequada que garanta uma execução fácil e que preserve as tropas de riscos ou fadigas exageradas que, afetando o seu moral, poderão comprometer o êxito das operações. A velocidade média deste tipo de deslocamento varia da noite para o dia, por exemplo, um deslocamento de 6 horas, de noite são executados entre 15 a 18 Km, de dia entre 20 e 24 Km. No entanto, todos estes valores no terreno estão sujeitos a alterações, para tal temos de ter em consideração alguns fatores, como o calor e o frio excessivos, vento forte, chuva e neve, relevo, condições do terreno, estado moral e fadiga dos homens.

Para um Comandante, a obtenção de resultados decisivos no campo de batalha pode depender, em grande escala, da capacidade de marcha das suas tropas. As tropas, deverão estar em condições de suportar as situações de marcha mais desfavoráveis, que encontrem no decorrer das operações. Para tal, deverão ser gradualmente instruídas, de modo, a superarem essas adversidades; uma vez conseguido, deverá ser mantido, ainda que por vezes se faça com um vasto emprego de transportes mecânicos.


A presença de vegetação provê momentos de sombra, amenizando o calor, mas na Ilha da Marambaia-RJ, o terreno continua sempre arenoso, tanto quanto na praia, o que não ameniza o esforço da marcha. Imagem da MARAMBEX III 2017.

Para tropas em treinamento, a marcha é uma das ferramentas mais eficientes de aperfeiçoamento da resistência física, mental e moral do jovem militar, serve de laboratório para a análise de novas táticas de deslocamento e manobras das mais diversas. Como escutei na última marcha que pude participar na Ilha da Marambaia, foi dito em alto e bom tom pelos instrutores; "- É fácil ser amigo de turminha de copo, na balada ou na praia... Aqui enfrentando essa marcha com seu equipamento de campanha, quando um de vocês desmaiar no caminho, veremos quem será o primeiro a se dispor a te ajudar a carregar seu equipamento ou te dar a água de uso pessoal..."

A carga individual nas marchas militares

Uma das maiores dificuldades neste tipo de ações é o peso que será transportado pelo combatente. A carga composta pelo armamento, munições, material especializado, água e ração, quando a missão é de longa duração, torna-se pesada, o que dificulta a locomoção dos soldados, chegando a pesar entre 35 e 40 quilos. Torna-se um desafio, caminhar longas distâncias, e se necessário, correr, ultrapassar muros e outros obstáculos. 


Desde a saída do quartel, o aluno não se separa mais de sua mochila, apetrechos e armas.
Imagem da MARAMBEX III 2017.

É igualmente importante, ter a capacidade de transportar um camarada ferido, até uma área segura onde possa receber os cuidados médicos. Isso mostra o óbvio pertinente à tarefa militar, que acaba sempre exigindo esforços além do normal suportado para pessoas sem qualquer treinamento, basta saber o exemplo do recomendando para carga de pessoas em atividades civis de lazer esportivo, geralmente para praticantes de trekking, a sugestão de jamais carregar além de 1/3 do peso de seu corpo para os homens e 1/4 para mulheres.


Terreno fácil não faz infante forte. Imagem da MARAMBEX III 2017.

Porém uma das maiores cargas que um militar portará após uma marcha operativa, é o conhecimento de si mesmo, a superação  e o orgulho de adquirir a capacidade de resistência física e moral para enfrentar adversidades que saem da esfera do homem comum.

Preparar para resistir

Logicamente, existe uma preparação prévia para todos antes das marchas operativas, que começa já nos primeiros dias de engajamento na caserna, com a rotina de treinamentos de educação física e disciplinas na alimentação. Nenhum militar vai para uma marcha sem antes ter o devido acompanhamento médico e a avaliação de profissionais de educação física de suas organizações militares. Tudo com o intento de aperfeiçoar ao máximo possível a resistência do militar para a evolução física de sua resistência.


A diversidade de terrenos na marcha oferece belas paisagens mas não alivia a carga, então que os ombros e pernas fiquem mais fortes... Imagem da MARAMBEX III 2017.

A resistência ao esforço é entendida como “a capacidade de suportar e recuperar da fadiga física e psíquica” (Romão e Pais, 1999 a, p.79) é outro ponto de grande relevância. Todavia, defini-la não é uma tarefa fácil uma vez que existem tantas definições quantos os autores. Para Matvéiev (1991) existem quatro grupos de fatores que são a base da resistência para as diversas AF. O primeiro grupo é o dos Fatores Psicológicos da personalidade, relacionados com a motivação dos indivíduos, com a sua atitude e estabilidade perante as AF. Outro grupo é o dos Fatores de Provisão Energética, relacionado com os recursos energéticos do organismo, com a forma do organismo realizar o metabolismo 16 e as transformações de energia. 


Ninguém fica sem sujar um pouco os pés em uma boa marcha! Imagem da MARAMBEX III 2017.

O terceiro grupo refere-se aos Fatores de Estabilidade Funcional que permite que o organismo conserve a sua atividade funcional, durante as modificações que vão ocorrendo durante o trabalho à medida que a fadiga se vai instalando. Por último, estão os Fatores de Economia Funcional que expressam a redução do consumo de energia à medida que se eleva o nível de treino. Esta redução depende da eficácia de emprego dos recursos energéticos do organismo. 

Galeria de imagens:


Sim, também marchei, mas devido a minha "antiguidade" só levei 1/3 do peso total (equipamentos de uso pessoal, câmera, baterias, água, kit 1ºs socorros, etc...) que os alunos portavam. E sabiamente a cada pausa aproveitei bem as sombras.


Toda marcha tem momentos de pausa, mas... Ninguém baixa a guarda ao que se passa ao redor, nem os convidados! Imagem da MARAMBEX III 2017.












Referências bibliográficas: 
- A importância da Marcha como técnica de deslocamento no desempenho operacional das Unidades de Infantaria.
Por: Bruno Miguel dos Santos Folhas - Aspirante Oficial Aluno Infantaria
Orientador: Major de Infantaria José Marques
Relatório Científico Final do Trabalho de Investigação Aplicada
Lisboa, julho 2012

- (Deuster, 1997*) Dra. Patricia A. Deuster is Associate Professor and Director of the Human Performance Laboratory in the Department of Military and Emergency Medicine at the Uniformed Services University of the Health Sciences, School of Medicine, in Bethesda, Maryland.
Books: The Navy Seal Nutrition Guide, The Navy SEAL Physical Fitness Guide.

2 comentários:

Unknown disse...

Os meninos gostam muito desse momento, mas ainda temem,fuzileiro 6515 amou esses momentos e está lá defendendo a nossa Pátria.parabens a todos os fuzileiros.

Velásquez disse...

Muito obrigado pela postagem deste texto. Está me auxiliando bastante no planejamento de nossa 1a marcha pelo 2º Batalhão PMAC.

Cap PM Velásquez
Polícia Militar - Servir e Proteger, sempre