quarta-feira, 18 de julho de 2018

Documentos quase centenários que estavam enterrado no 3.º GAAAe serão expostos em evento na cidade de Caxias do Sul

Documentos de quase um século atrás são encontrados enterrados no quartel do Exército, em Caxias do Sul 
Por: Redação OD
Talvez por não achar relevante, o coronel José Pena de Moraes, então intendente de Caxias do Sul (equivalente a prefeito), deixou de registrar nos relatórios anuais sobre o desenvolvimento da cidade uma solenidade na qual ele mesmo participou no dia 3 de abril de 1922. Ao lado do então ministro da Guerra do Brasil, Pandiá Calógeras, e do lendário marechal e sertanista Cândido Rondon, o intendente lançou a pedra fundamental de construção do quartel do Exército, local que hoje conhecemos como a sede do 3.º Grupo de Artilharia Antiaérea (3.º GAAAe), no bairro Rio Branco. Para marcar este momento, as lideranças guardaram a ata da solenidade, alguns jornais da época e quatro moedas dentro de uma urna de metal lacrada. A pequena caixa foi escondida sob o marco inicial das obras para a posteridade, mas o tempo tratou de apagar da memória aquele simbólico momento que consolidava a presença do Exército em Caxias.

Esse passado permaneceu intocado até a semana passada e ressurgiu graças à curiosidade de dois militares do 3º GAAAe. Muitos oficiais e soldados sabiam da existência de uma cápsula do tempo, mas a localização dela era incerta.  Entre as pilhas de papeis que abarrotam a mesa do cabo Glauber Tiago Dal Paz, responsável por resgatar o histórico do centenário da instituição militar na cidade, havia um livro de Alvino Brugalli, falecido escritor e militar da reserva de Caxias do Sul.  O capitão Felipe de Freitas Faulstich folheou o material e descobriu uma indicação sobre o ponto onde a cápsula havia sido enterrada: um marco de concreto instalado logo após a entrada do quartel. Fomos até esse marco e batemos na pedra. Sentimos que uma parte era oca, só não sabíamos realmente o que havia dentro, conta o capitão Faulstich. Assim, no dia 12 de julho, o comandante do 3º GAAAe, coronel Leandro Fernandes Moraes, determinou a abertura do marco e os militares enfim acharam a urna lacrada havia 96 anos. 
A pequena caixa de metal, que estava chumbada, foi aberta no próprio quartel. Os militares encontraram um exemplar do antigo jornal O Brasil, periódico publicado de 1909 a 1924 em Caxias do Sul, e um exemplar do jornal a Federação, que circulou no Rio Grande do Sul de 1884 a 1937. As duas publicações eram do dia 1º de abril de 1922. Além disso, haviam quatro moedas de réis, vigente na época, e um relatório da construtora de Santos, contratada para executar a construção do quartel e ata de início da obra com diversas assinaturas. Foi emocionante poder ver algo verdadeiro de pessoas que deixaram informações sobre a participação da criação do quartel. É incrível — diz o capitão Faulstich. Após passar por higienização e recuperação, a urna e o conteúdo serão expostos na Sala Coronel Arcy da Rocha Nóbrega, que concentra a memória do 3º GAAAe. Os militares não descartam enterrar uma nova cápsula do tempo para marcar os 100 anos do Exército em Caxias.
Jornal registrou o ato em abril de 1922
O conteúdo dos documentos e jornais guardados na urna ainda não foram analisados. No momento, o principal objetivo é evitar a destruição do material, que está parcialmente deteriorado por conta da ação do tempo e da umidade. Alguns papéis apodrecidos impedem a leitura. O 3º GAAAe está em tratativas com a Universidade de Caxias do Sul (UCS) para recuperar o material. Na tarde de terça-feira, os documentos históricos foram analisados de forma preliminar pela restauradora Angela Bertuol, que integra o Instituto Memória Histórica e Cultural da UCS. Dá para recuperar a informação que não está perdida totalmente. A princípio, é possível fazer uma boa higienização  — avalia Angela. O cabo Dal Paz, que está empolgado em desvendar o conteúdo, desconfia que os documentos trazem os detalhes dos acontecimentos que marcaram o início das obras no dia 3 abril de 1922, como já indicavam as publicações da época. Segundo consta na reportagem veiculada no dia 8 de abril daquele ano pelo jornal O Brasil (foto abaixo), diversas atividades antecederam o lançamento da cápsula do tempo. 
Jornal de 1922 registrou momento em que caixa
 foi guardada no terreno do 3º GAAAe
Foto: Reprodução / Centro de Memória da Câmara de Vereadores
A comitiva do ministro Calógeras e do marechal Rondon, que também tinha como integrante o famoso empresário Roberto Cochrane Simonsen, havia passado por fábricas da cidade. Numa das visitas, as autoridades foram recebidas por Abramo Eberle. Da metalúrgica Eberle, o grupo seguiu para o Rio Branco, onde ocorreu a cerimônia de lançamento das obras do quartel. Ao som do hino nacional, a urna foi enterrada com o auxílio de uma pá de prata especialmente fabricada para aquele momento. Ao final, Pena de Moraes saudou o ministro da Guerra com uma taça de champanhe, segundo a reportagem. O quartel só seria inaugurado em 1923, momento que o intendente fez questão de registrar no relatório oficial da administração pública de Caxias do Sul. Os jornais colocados ali foram escolhidos com propósito especial. Anunciavam a visita das autoridades, ou seja, trata-se de uma prova do que  que aconteceu realmente — diz o cabo Dal Paz, formado em História. Dal Paz está produzindo um livro para contar a história do centenário do Exército na cidade. A publicação deve ser lançada em 2019.
Origem passa por clube de tiro
A localização da cápsula do tempo ocorre num momento especial para o Exército em Caxias do Sul. Nesta semana, a instituição comemora os 100 anos de instalação na cidade e os 68 anos de abertura do 3º GAAAe, local por onde já passaram milhares de jovens da região e de outras parte do Estado e do país. A história da instituição federal na cidade começa em 1918, com a incorporação de um clube de tiro. A unidade, que passou a ser chamada de Tiro de Guerra nº 248, era formada por moradores conhecidos de Caxias do Sul, entre eles José Pena de Moraes e o professor Apolinário Alves dos Santos. A sociedade quis vincular o Tiro ao Exército com o propósito de adestrar o uso de armas e também para fornecer efetivo na época — diz o comandante do 3º GAAAe, coronel Leandro Fernandes Moraes. Aberto na área central da cidade, o Tiro de Guerra passou a ser usado para treinamentos e funcionou até meados de 1945, quando foi desativado. Antes disso, o quartel no bairro Rio Branco já havia sido ocupado pelo 9º Batalhão de Caçadores em 1927, unidade que forneceu pracinhas para a Segunda Guerra Mundial na Europa e foi extinta em 1949. Em 1950, o quartel da Rio Branco virou sede do 1º Grupo do Regimento de Artilharia Antiaérea, hoje 3º GAAAe. 
Comandante do 3º GAAAe, coronel Leandro Fernandes Moraes
mostra memorial para onde cápsula do tempo deve ser exposta
Com isso, a cidade atingiu um novo patamar, pois passou a treinar militares em táticas para a derrubada de aviões com uso armas pesadas em apoio à Força Aérea Brasileira. Desde sempre, o 3º GAAAe foi referência para famílias interessadas em garantir uma educação aos filhos. Se antes eram os pais que obrigavam os filhos a servir o Exército, hoje são os jovens que escolhem a opção por conta própria. Segundo o coronel Moraes, de 3,5 mil jovens que fizeram alistamento em 2017, mais de 2 mil demonstraram interesse de ingressar nas Forças Armadas de forma voluntária. Como o quadro é limitado, pouco mais de 200 ingressaram no 3º GAAAe, entre eles Natã Molina da Fontoura, 19. O jovem é aspirante do Núcleo de Preparação de Oficiais da Reserva (NPOR) e atualmente é o número 1 do grupo (aquele que mais se destaca), "Aprendi o significado da disciplina, que é fazer coisas corretas mesmo quando não se tem vontade e mesmo quando ninguém olha, orgulha-se". Atualmente, o 3º GAAAe é composto por 452 militares. Aqui, nós pegamos jovens que trazem os atributos de casa e moldamos as virtudes — resume o comandante do 3º GAAAe.
Programação
O 3º GAAAe promove festejos em alusão aos 100 anos do Exército na cidade. Confira:
- Quarta-feira, 10h: instalação de obelisco, marco do centenário, na Praça Dante Alighieri.
- Quarta-feira, às 15h: cultos religiosos no 3º GAAAe.
- Quinta-feira, às 19h: sessão solene na Câmara de Vereadores de Caxias do Sul.
- Sábado, às 16h: apresentação da banda militar do 19º Batalhão de Infantaria Motorizado de São Leopoldo, no Shopping Iguatemi.
- Sábado, das 10h às 22h, e domingo, das 11h às 22h: exposição de canhão antiaéreo, radar, viaturas e itens de emprego militar no Shopping Iguatemi.

Natã Molina da Fontoura, 19 anos, é parte da nova geração de aspirantes do 3º GAAAe

*Com informações do site O Pioneiro, / Foto: Lucas Amorellli/Agencia RBS

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