Por:
Mauro
Cesar Barbosa CID & Joel
CAJAZEIRA
A
ordem global contemporânea tem se caracterizado por um ambiente
multipolar e assimétrico, no qual prevalecem a incerteza e a
possibilidade de inúmeros atores gerarem insegurança. O século XXI
apresenta desafios mais complexos do que os enfrentados durante o
período de confrontação ideológica bipolar. Assim, à luz de uma
agenda global conflitiva e complexa, cujo alcance tem perpassado a
esfera doméstica e internacional, observa-se a mudança da percepção
costumeira das ameaças à segurança, tanto do Estado quanto dos
indivíduos.
Tal
dinâmica é carreada pelo terrorismo catastrófico; por delitos
transnacionais (com ênfase para o tráfico de drogas internacional);
por conflitos étnicos; por 'revoluções coloridas'; por disputas
energéticas e ambientais; e pela atual 'crise dos refugiados'. Fruto
desse quadro, constata-se a ascensão de novos atores no 'jogo
global', como o crime organizado transnacional (COT) e as
organizações terroristas transnacionais. Transpondo para o cenário
brasileiro no período pós-Guerra Fria, sabe-se que a Constituição
Federal (CF) de 1988, no seu artigo 144, trata do termo 'segurança
pública'. Conforme a CF, "A segurança pública, dever do
Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a
preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio, (...)" (BRASIL, 1988).
Para
isso, determina como principais órgãos de segurança pública
(OSP): a Polícia Federal; a Polícia Rodoviária Federal; a Polícia
Ferroviária Federal; as Polícias Civis; as Polícias Militares e os
Corpos de Bombeiros Militares. Já no artigo 142, a CF prevê
que as Forças Armadas (FA) "destinam-se à defesa da Pátria, à
garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer um
destes, da lei e da ordem". Logo, o Brasil é uma República
Federativa, na qual a segurança pública é responsabilidade direta
das polícias federais e estaduais, mas que admite o emprego das FA
para garantir a lei e a ordem em casos excepcionais.
Nas
fronteiras brasileiras, os ilícitos transnacionais dividem-se em
duas vertentes: a dos crimes contra a pessoa, envolvendo o
narcotráfico, o tráfico de armas e munições e o tráfico humano;
e a dos crimes financeiros, como a lavagem de dinheiro. Desse modo, a
grande extensão da fronteira terrestre, a escassez de recursos, o
número insuficiente de postos de fiscalização, o pequeno efetivo
de agentes federais e a corrupção fragilizam o controle estatal na
faixa de fronteira. Nos grandes centros urbanos, as ameaças estão
associadas ao crescimento desordenado.
Há
questões de toda ordem: problemas ambientais e sanitários,
poluição, deficiências na mobilidade urbana e um precário mercado
de trabalho. Portanto, processos de urbanização indisciplinados
produzem cidades frágeis, marcadas por desigualdades sociais e por
altas taxas de letalidade, privando determinadas áreas do acesso aos
serviços públicos e da proteção estatal. Em consequência, as
favelas brasileiras são a materialização da desigualdade social e
constituem-se em meio fértil para a propagação da violência e de
inúmeras ameaças à segurança do Estado e dos indivíduos.
Com
o avanço dessas organizações criminosas, já na década de 2010,
observa-se o surgimento de black spots (pontos negros) nas grandes
cidades, fruto da falha na governança por parte das Autoridades
Centrais. No rol das respostas deflagradas pelo Estado Brasileiro, há
uma série de ações com ênfase na Expressão Militar do Poder
Nacional, que é a capacidade resultante da integração dos meios da
Nação, acionados pela vontade nacional, com o objetivo de manter e
de conquistar os objetivos nacionais. Assim, no século XXI, é
recorrente o emprego das Forças Armadas em operações, entre as
quais se destacam as ações de estabilização de comunidades, a
manutenção da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em face de greves de
policiais e a garantia do pleito eleitoral.
No
âmbito do Exército Brasileiro (EB), avançando no fomento das
operações interagências, a Portaria n.º 192 do Estado-Maior do
Exército, de 21 de novembro de 2012, aprovou a Diretriz para a
implantação do Projeto Estratégico PROTEGER, com o objetivo de
viabilizar ao Exército a capacidade efetiva para a proteção das
Estruturas Estratégicas Terrestres nacionais, em complemento aos
sistemas de segurança orgânica e de segurança pública. Na
perspectiva da Proteção Integrada, contida no Manual de Operações
do Exército, passou-se a abarcar todas as medidas necessárias para
proteger a sociedade, num esforço essencialmente interagências, nas
seguintes atividades: garantia dos poderes constitucionais; garantia
da lei e da ordem; proteção de estruturas estratégicas; prevenção
e combate ao terrorismo; e participação da Força Terrestre em
ações na faixa de fronteira.
Esse
repertório de atividades é conduzido pela Força Terrestre nas
Operações de Apoio a Órgãos Governamentais, alcançando sete
possibilidades de emprego, sendo cinco delas reunidas sob a demanda
da Proteção Integrada (garantia dos poderes constitucionais, da lei
e da ordem; proteção de estruturas estratégicas; ações na faixa
de fronteira; prevenção e combate ao terrorismo; e ações sob a
égide de organismos internacionais), e somadas ao emprego no apoio à
política externa em tempo de paz ou de crise; e às atribuições
subsidiárias.
Percebe-se
que o termo "Proteção Integrada" é de natureza
restritiva, pois limita o entendimento a situações concretas quanto
ao bem proteger e aos atores intervenientes. O conceito de "Segurança
Integrada" é o mais adequado à atuação conjunta em ambiente
interagências e, consequentemente, é mais apropriado para os
estudos doutrinários. Como única referência conceitual
existente na Doutrina Militar de Defesa, segurança integrada trata
da "expressão usada nos planejamentos de garantia da lei e da
ordem da Força Terrestre, com o objetivo de estimular e caracterizar
maior participação e integração de todos os setores
envolvidos." Portanto, há espaço para uma política
pública permanente, com a finalidade de otimizar a perspectiva da
segurança integrada e da sua gestão, especialmente quando se
observa a atual instabilidade da situação da segurança no Brasil,
perpassada por ameaças que transitam da esfera da segurança
nacional para a da segurança pública.
Nota da Redação: Os autores do artigo os Senhores Mauro Cesar Barbosa CID e Joel CAJAZEIRA são Oficiais do Exército Brasileiro da Arma de Artilharia e Infantaria, respectivamente, e no momento estão cursando a ECEME, onde o texto é um extrato do Projeto Interdisciplinar (PI) sobre
SEGURANÇA INTEGRADA dos alunos do 2º ano do Curso de Comando e
Estado-Maior do Exército (CCEM) da Escola de Comando e Estado-Maior
do Exército (ECEME).
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