Por: Redação OD
Os
exércitos do Brasil e da Colômbia vão ampliar as ações bilaterais permanentes
para reforçar a vigilância e o intercâmbio no combate a crimes transnacionais.
As iniciativas vão desde instalação de mais pelotões militares na fronteira
comum e ensino de idioma para melhorar a comunicação entre as unidades dos dois
países até compartilhamento de sistemas e tecnologias de informação,
combustível e pistas de pouso para aeronaves. Incluem ainda a aproximação com
instituições de pesquisa para conhecer os impactos da exploração ilegal das
riquezas naturais (minerais e madeira), uma importante fonte de recursos
financeiros para sustentar o narcotráfico. “O inimigo se adapta dia a dia”, afirmou o
General-Brigadeiro Francisco Javier Cruz Ricci, Comandante da 6ª Divisão de
Exército Colômbia, sediada em Florencia (capital do departamento de Caquetá),
durante a Operação Traíra, em reunião realizada em Tabatinga, no oeste do
estado brasileiro do Amazonas. Na Operação Traíra, realizada de 4 a 8 de abril, os
militares do Brasil, da Colômbia e do Peru uniram “inteligência, tecnologia e
confiança entre os exércitos”, segundo o Gen Brig Cruz.
“Essa guerra na fronteira precisa unir toda a
Amazônia, ela é pan-amazônica”, disse o General de Exército Guilherme Cals
Theophilo Gaspar de Oliveira, Comandante do Comando Logístico (COLOG) do
Exército Brasileiro (EB) que participou da Operação Traíra e esteve à frente do
Comando Militar da Amazônia (CMA) até 15 de abril. Além da Colômbia, o EB pretende ampliar as
ações com a Bolívia. Observadores da Força Aérea, do Exército e da Marinha do
país andino acompanharam dois dias da Operação Traíra (6 e 7 de abril) na
região de Cruzeiro do Sul, no Acre. O Tenente-Coronel William Camacho Martins,
representante do 6º Distrito Naval, com sede em Cobija, estado boliviano de
Pando, informou que o grupo conheceu a estrutura de combate aos crimes e como o
EB utiliza seu poder de polícia.
“[Na Bolívia], interessa-nos levar esta
experiência ao nosso país e criar normas para que a ação na fronteira seja mais
efetiva”, afirmou o Ten Cor Martins, acrescentando que a Bolívia pretende
instalar pelotões fronteiriços, seguindo o modelo do EB. “A Amazônia boliviana
é corredor da droga peruana para entrar no Brasil, por isso temos de atuar
juntos.” A Colômbia conta com o compromisso de países
produtores de cocaína de participarem de um esforço coletivo para reduzir ao
máximo o cultivo da coca (principal ingrediente usado na droga), erradicando
plantações ilegais e laboratórios de pasta-base. Nos três primeiros meses do
ano, a 6ª Divisão de Exército da Colômbia neutralizou 320 laboratórios e nove
cristalizadeiros, além de apreender 4 toneladas de cocaína “prontas para
exportar”, segundo o Gen Brig Cruz.
Esforços conjuntos
O reforço das iniciativas, seguindo operações
militares conjuntas como a São Joaquim,
a Anostomus e a Traíra , é validado pelo Decreto 8.698 de 28 de
2016, da Presidência da República do Brasil, que promulgou o Memorando de
Entendimento entre os governos do Brasil, Colômbia e Peru para ações de combate
a atividades ilícitas em rios fronteiriços ou comuns. O Gen Theophilo lembrou que o acordo permitiu
intensificar a ação coordenada. Ele destacou que o incremento foi sinalizado em
auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) brasileiro sobre o Plano
Estratégico de Fronteiras (PEF), divulgada em 2015, que detectou fragilidades
na proteção e segurança dos 16.886 km da fronteira entre o sul e o norte do
Brasil. A auditoria constatou baixo investimento e carência de recursos humanos
e materiais, como aeronaves, sistemas de comunicação interoperáveis e cães
farejadores.
“As conclusões realçam a vulnerabilidade do espaço
territorial que contribui para agravar a condição de ambiente propício aos
ilícitos de tráfico de drogas e armas”, advertiu o tribunal. “O documento mostra que quase não há segurança
acima de Mato Grosso. A área vai ficando rarefeita e o que existe são os Pelotões
Especiais de Fronteira (PEFs) do EB”, disse o Gen Theophilo. A auditoria reconheceu a importância
do Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (SISFRON) ,
projeto estratégico do Exército. O sistema de vigilância utiliza sensoreamento
remoto, drones, aviões de asa fixa e radares nacionais. “Vamos equipar os
nossos PEFs com tecnologia para fazer um combate melhor”, completou o Gen
Theophilo.
A aquisição de uma aeronave de asa fixa para o 4º
Batalhão de Avião do Exército (4º BAvEx), situado em Manaus, é prioridade,
disse o Gen. Theophilo. Antes da Operação Traíra, ele foi ao Chile para
conhecer modelos na 9ª Feira
Internacional do Ar e do Espaço (FIDAE). Os estudos sobre o
equipamento mais adequado e o investimento serão aprofundados pelo COLOG. O Gen Theophilo destacou ainda o Programa Amazônia
Conectada, que prevê 7.800 km de fibra ótica ligando 52 municípios situados nas
calhas dos rios Negro, Madeira, Solimões, Purus e Juruá, no Amazonas. A
infovia, instalada sob a água, já liga Coari e Tefé. Segundo o Gen. Theophilo,
os cabos chegarão a Tabatinga até dezembro, transformando-se em um recurso
decisivo na cooperação com a Colômbia, pois melhorarão a infraestrutura de
comunicação digital.
Pesquisa ambiental
Outro programa do CMA é o Pró-Amazônia, que envolve
convênios com centros de pesquisa em todo o Brasil. Na Operação Traíra,
pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) estavam na comitiva. Militares
brasileiros e colombianos e os pesquisadores do INPA e da UFRJ se reuniram com
integrantes do Instituto Amazônico de Investigações Científicas (SINCHI) e da
Universidade Nacional da Colômbia, instituições colombianas com unidades em
Leticia, para troca de informações. Chefe do Centro de Operações do CMA, o General de
Brigada Antônio Manoel de Barros diz que a proximidade com áreas de pesquisa
permite aprofundar o conhecimento sobre os potenciais naturais da Amazônia, a
forma de extração de minerais e como a ação de grupos ilegais pode comprometer
o futuro das reservas.
Colômbia e Brasil preocupam-se com o uso de mercúrio na
extração de jazidas de ouro, pois a substância contamina rios, mata a fauna e a
flora e ainda pode afetar as populações. O pesquisador João Paulo Machado Torres, do
Instituto de Biofísica da UFRJ, coletou amostras de solo e analisará em
laboratório a existência de metais pesados e micropoluentes. “O problema na
Amazônia é a entrada do mercúrio (de forma natural ou do garimpo), que é
metilado em ecossistemas ribeirinhos, amplificando o dano do ciclo ao ambiente.
Esse processo biogeoquímico transforma o mercúrio, que já é tóxico, em uma
molécula até mil vezes mais tóxica e perigosa.”
Foco na interoperabilidade
Como a interoperabilidade é um fator decisivo na
ação compartilhada, a Colômbia quer adotar o mesmo protocolo de comunicação por
rádio usado pelo EB. Com a mesma plataforma, um piloto de uma aeronave
colombiana poderá conversar com o do Brasil, em uma operação ou na ação
rotineira de vigilância. “Já temos 70% das unidades habilitadas no mesmo
sistema”, disse o Gen Brig Cruz. “Até o fim do ano, todas [as organizações
militares da divisão] estarão inseridas. Será espetacular, pois será tecnologia
para intercâmbio de informações e mais oportunidades de ação das tropas e
melhores resultados.” O Gen Brig Cruz já participou de reunião em
Brasília, capital do Brasil, para conhecer o escopo do SISFRON, cujos testes
começaram em 2015 na região do Comando Militar do Oeste (CMO), no estado de
Mato Grosso. “O plano é termos o mesmo modelo, para que seja possível trabalhar
com a mesma doutrina e equipe, cada um com sua estrutura de segurança, para
integrar completamente as forças na região.
Já estamos em conversações para
isso”, adiantou. “Vamos usar a tecnologia. Onde não tem soldado, teremos
satélite ou drone.” A criação de mais pelotões de fronteira na
interface territorial com o Brasil está entre as medidas para melhorar a ação
contra crimes. Atualmente, são quatro unidades posicionadas na área de
abrangência da 6ª Divisão de Exército. O reforço faz parte do Programa de
Modernização do Exército da Colômbia, com metas até 2018, 2022 e 2030. “Está
previsto formar um Exército de proteção na fronteira, com maior número de
postos para controlar ao máximo o trânsito de ilícitos”, afirmou o Gen Brig
Cruz.
Operações conjuntas inovadoras
O abastecimento de aeronaves é outra inovação no
apoio entre os países. Os comandos militares destacaram o suprimento de
combustível de aviação como um gargalo devido às longas distâncias e à
dificuldade de transporte, feito por rios. Eles também pretendem estabelecer um
marco regulatório para permitir que um helicóptero colombiano pouse em pistas
brasileiras para abastecimento e o mesmo ocorra com aeronaves do EB. “A ideia é
que seja um único solo na fronteira”, disse o Gen Brig Cruz.
O domínio do português por oficiais da 6ª Divisão
de Exército será um requisito para atuar em unidades localizadas na fronteira.
De 10 a 20 oficiais concluirão o curso do idioma neste ano. A meta é assegurar
que até 60% dos militares graduados da divisão falem português. “O oficial deslocado para atuar em cidades como Leticia terá a formação
antes”, explicou o Gen Brig Cruz, que também quer a presença de oficial da área
de inteligência do EB em seu estado-maior, em Florencia, onde o Peru já tem um
militar junto ao comando. “Isso facilitará a comunicação direta dos nossos
militares com as unidades brasileiras, principalmente nas emergências. É
fundamental para futuras ações.”
FONTE: Diálogo Américas, Por Patrícia Comunello
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