Por: Jonas de Moraes Correa Neto
Eram dois bravos! Barroso, oficial de Marinha, ensimesmado, meticuloso, competente, hábil marujo, experiente nas fainas marinheiras e nos postos de combate de muitos navios. Osório, oficial de Cavalaria, extrovertido, arrojado, experimentado nas tropeadas e nos entreveros, nas cargas violentas e nas lutas sem quartel. Eram ases naquilo que faziam, por profissão e por nobreza, cumprindo missões de perigos e de sacrifícios, chefiando de perto gente aguerrida e estóica, gente que obedecia sem vacilar, confiando neles.
Um,
Barroso, gozava da consideração dos seus chefes e pares; mas não
era renomado entre a marujada, salvo entre quem o conhecia. O outro,
Osório, cedo ficou célebre lá nas refregas do extremo sul, onde
seus feitos eram contados nas rodadas de mate, nas prosas dos galpões
e nos fogões gaúchos. Barroso não teve seu nome amarrado a um
toque de corneta, nem silvos de apito poetizando sua pessoa. Osório
teve. Em seu louvor, compuseram compassos de clarim, que anunciavam à
tropa: “Lá vem Manoel Luís!”
Pois
assim chegaram os dois, cada qual com sua personalidade, ao seu
momento de maior glória: Barroso em Riachuelo, Osório em Tuiuti.
Então, estiveram formidáveis. E se projetaram com brilho ímpar,
como padrões de liderança militar, na História do Brasil. Estão
imortalizados, nas Forças Armadas, como uma espécie de
vice-patronos da Marinha e do Exército. Tudo isso tem levado a
estabelecer um paralelo entre as figuras do Almirante Barroso e do
General Osório. A especulação se justifica: eles foram as
personagens exponenciais de duas batalhas duríssimas, de imensa
importância, logo no começo da Guerra da Tríplice Aliança contra
o governo do Paraguai.
Em
Riachuelo, a 11 de junho de 1865, travou-se um combate naval que iria
assumir status de batalha em vista dos meios envolvidos e,
principalmente, do seu resultado, essencial para o prosseguimento das
operações aliadas em curso, tanto nos rios quanto em terra. De
fato, a força naval paraguaia, ao perder a maioria dos seus meios
flutuantes, o que definitivamente perdeu foi a capacidade de disputar
o domínio das vias fluviais. Nessa batalha, a Bandeira do Brasil
encontrou-se sozinha diante do inimigo! O comandante, o vencedor, foi
o Chefe-de-Divisão Francisco Manoel Barroso.
Em
Tuiuti, a 24 de maio de 1866 (menos de um ano após Riachuelo),
ocorreu a maior batalha campal jamais travada em campos
sulamericanos. Foram incontáveis os rasgos de valor; esbanjou-se
valentia (aliás, de parte a parte). Quando terminou a peleja, as
forças terrestres paraguaias estavam mais do que vencidas: estavam
impossibilitadas de, em médio prazo, recuperar-se com recursos
humanos e materiais em condições de enfrentar as exigências da
campanha que viria. O Paraguai fez, sim, prodígios de superação;
porém, após a derrota em Tuiuti, nada mais conseguiu do que cair
numa defensiva desesperada, sem chance de reversão.
Nessa
pugna, atingiu dimensão solar a pessoa do comandante do Exército
Brasileiro e líder de batalha de toda a força aliada, o
Marechal-de-Campo Manoel Luís Osório. Eis aí os dois titãs dessas
pelejas retumbantes. Quem eram eles, realmente, esses dois chefes
exemplares? Vamos ver-lhes as vidas, em enfoques paralelos e
ligeiros.
INDIVIDUALIDADES
Barroso
nasceu em Lisboa em 29 de setembro de 1804. Veio para o Brasil no
navio que trouxe a Família Real, em 1808. Tinha quatro anos e
acompanhava seus familiares, pois seu pai, Capitão da Brigada Real
de Marinha, era comandante de uma das baterias de canhões da nau
capitânia Príncipe Real (atingiria o posto de tenente-coronel).
Desde moço, Barroso era fechado, pouco falante. Teve uma educação
básica e depois a profissional, feitas com esmero na Corte (Rio de
Janeiro). Escrevia com correção, em geral de modo conciso, mas
exato para seus fins.
Não
há trabalhos literários de sua autoria, só os funcionais (diários,
relatórios, correspondências). Merece ser destacada a “tocante,
singela e elegante parte do terrível e glorioso combate”, parte na
qual (no dizer de ilustre historiador) “brilha a calma
tranqüilidade de um bravo e a virtuosa modéstia de um benemérito”.
Principia Barroso com a frase lapidar: “Não fizemos tudo quanto
desejávamos, mas quanto podíamos”.
E
se estende em precisos relatos, em observações, citações de
pessoas e fatos, e em culto à verdade, como neste ponto: “O
inimigo nos esperava e não fugia”. Essa parte confirma que “o
estilo é o homem”, pois nela se identifica, muito além da secura
do chefe, um estado de alma. De Barroso, porém, pouco –
pouquíssimo – nos chegou de seu espírito. Era atilado. Empregava
muito a gíria marinheira e era dado a usar expressões
estereotipadas, para situações parecidas, como esta: “cada pau
aguenta com a sua vela” (i. é: cada um com sua tarefa).
Partiram
dele os emocionantes sinais de Riachuelo, bastante difundidos entre
nós, como: “atacar o inimigo que a glória é nossa” e “o
Brasil espera que cada um cumpra o seu dever”. Convém citar, por
altamente expressivo, o que Barroso afirmou ao Almirante Carlos de
Noronha: “A minha maior glória... (não é Riachuelo...) .... é
ter ido de aspirante a almirante sem fazer mal a ninguém.” (num
encontro em Montevidéu, tendo ele quase 80 anos e estando cego). A
vida militar de Barroso foi sempre coerente.
Ele
foi marujo por vocação; mais do que isso: por gosto. Era um
completo lobo-do-mar. Também era, no miudinho, um técnico naval, um
conhecedor sapiente da maneira correta de realizar tarefas típicas,
de fazer revisões e reparos nas estruturas e nos elementos
propulsores dos navios, de manter, dispor e usar o armamento. Esse
“hábil manobrista e excelente navegador” era um instrutor capaz,
um disciplinador cuidadoso, um homem firme e corajoso – portanto,
um combatente.
Osório
nasceu em 10 de maio de 1808, em uma estância gaúcha do início do
século XIX, com todas as influências culturais e sociológicas que
tal origem continha. Era filho de um modesto furriel de tropas
provinciais, pouco depois passando a agricultor e, no ambiente fluido
das lutas fronteiriças, de novo militar, tão conceituado que
chegaria a tenente-coronel. A instrução básica de Manoel Luís foi
rudimentar. Estudos profissionais regulares nem pôde fazer; quando
teve oportunidade, ainda jovem, requereu matrícula na Academia Real
Militar, mas foi-lhe negada, sob a alegação de que faria falta na
campanha da Cisplatina.
É
que carecia de uma garantia de berço. Porém, esse escanteio não
diminuiu nele a sede de aprender e, durante toda a sua vida, tratou
do auto-aprendizado – inclusive do profissional – nos cursos
realísticos da tarimba militar prestante. Osório não redigia bem;
aos poucos, com atenção e persistência, foi melhorando e alcançou
boas condições. Falava bem, com clareza; era bom orador, fluente,
direto ao assunto; discursava com naturalidade e ênfase, podendo ser
cortês, ferino, desbordante ou gozador. Era dado a versejar, e
repentista incisivo, mordaz, mesmo em questões de serviço.
Deixou-nos
uma porção de pensamentos, de ditos, que são, por si sós,
retratos precisos – e preciosos – do cidadão que ele era, e
verdadeiras máximas de comportamento ético e de posicionamento
diante de assuntos relevantes. Assim como Barroso com os jargões dos
marinheiros, Osório habituou-se ao linguajar típico dos gaúchos da
fronteira (brasileiros e platinos, em sua interpenetração) –
palavreado, dizeres, expressões. De Osório, não se pode afirmar
que tivesse sido militar por vocação.
Foi-o
quase que somente por efeito do ambiente belicoso do Rio Grande do
seu tempo, que o arregimentou ainda um menino e, pelas suas
qualidades, conservou-o engajado pela existência toda. Ele mesmo
confessou: “eu, que sou soldado sem muita paixão pela vida de
guerra...”; e disse que o dia mais feliz de sua vida seria quando
visse serem queimados todos os arsenais. Dizia também que entrava
nas campanhas devido ao “sentimento do dever”. É... e aí fazia
aquilo que sabia fazer melhor: comandar forças em combate, liderar
homens debaixo de fogo e presenteá-los com vitórias.
CARREIRA
MILITAR
Barroso
foi praça aos 17 anos (18 outubro de 1821) como aluno na Real
Academia de Marinha. Saiu guarda-marinha um ano depois (27 novembro
1822). Durante cerca de 30 anos galgou todos os postos até atingir o
generalato: chefe-de-divisão, em 2 dezembro de 1856. A seguir, e já
Barão do Amazonas (3 de janeiro de 1866), foi promovido a
chefe-de-esquadra (21 janeiro de 1867), vice-almirante (12 abril de
1868) e, ao final, reformado como almirante (9 de maio de 1873).
Osório,
que desde cedo acompanhava seu pai em muitas jornadas arriscadas,
começou como soldado de Cavalaria (1o de maio de 1823). Ia fazer 20
anos e servia na Legião de São Paulo, no sítio de Montevidéu. Em
outubro de 1824, era primeiro-cadete no 3o Regimento de Cavalaria do
Exército. De dezembro de 1824 até o generalato, foram 27 anos
percorrendo a cadeia hierárquica. Em 2 de dezembro de 1856
(exatamente na mesma data de Barroso), também alcançou o
generalato: brigadeiro graduado; seria efetivado em 15 junho de 1859.
Em
seqüência, foi promovido a marechal-de-campo (8 julho de 1865), já
na Guerra do Paraguai, foi feito Barão do Herval (18 de maio de
1866, no mesmo ano de Barroso); depois tenente-general (1o de junho
de 1867) e, finalmente, marechal-do-exército graduado (27 junho de
1877).
CAMPANHAS
Barroso
participou, na Cisplatina, da guerra contra as Províncias Unidas do
Rio da Prata, entre 1826 e 1828; era guarda-marinha, logo
segundo-tenente, embarcado em diversos navios. Teve seu batismo de
fogo em 29 de dezembro de 1826, como imediato do Brigue-Escuna D.
Januária, em combate no Rio Negro (Alto-Uruguai). Finda essa guerra,
à qual se deveu o nascimento da República Oriental do Uruguai,
continuou Barroso em serviços rotineiros, próprios de sua patente,
nas mais das vezes embarcado – até como imediato do seu antigo
colega de Academia, seu grande amigo Joaquim Marques Lisboa (o futuro
Marquês de Tamandaré e Patrono da nossa Marinha).
Em
1836/37, no comando do Brigue Brasileiro, como capitão-tenente e
capitão-de-fragata, tomou parte na luta contra a revolução dos
cabanos, no Pará. Durante a Revolução Farroupilha (1835/45), não
esteve em ações de combate, mas algumas vezes, embarcado, cumpriu
missões entre a Corte e o estuário do Prata, principalmente para
transporte de tropas e equipamentos para as forças legalistas. Na
guerra de 1851/52, contra Oribe e Rosas, foi comandante de navios,
participando do bloqueio do Prata e dos transportes de tropas. Entrou
em ação várias vezes, inclusive no forçamento do Passo do
Tonelero (17 dezembro de 1851).
Era
capitão-de-fragata; após a guerra, foi promovido a
capitão-de-mar-eguerra (3 de março de 1852). Na Campanha do Uruguai
(1864/65) e – imediatamente ligada a ela – na Guerra do Paraguai
(1865/70) foi onde mais teve participação e destaque em operações.
Era o comandante da Divisão Naval do Rio da Prata, desde 1862, com
sede em Montevidéu. Já em abril de 1865, passava a chefe do
Estado-Maior do Comandante-em-Chefe das Forças Navais em Operações
no Rio da Prata, o Almirante Tamandaré, e acumulava essas funções
com as de comandante da 2a Divisão Naval.
“Durante
a guerra do Paraguai, tomou parte, embarcado, nos principais eventos
da primeira fase da campanha: Corrientes, Mercedes, Cuevas, a guerra
das chatas, Riachuelo, Passo da Pátria, Curuzu, Curupaiti. ... Findo
o turbulento ano de 1866, agravou-se o estado de seus olhos
(catarata). Barroso pediu licença para tratar da saúde e se
recolheu à Corte. Na mesma ocasião, Tamandaré também se retirava
do teatro de operações, ao qual nenhum dos dois haveria de
retornar.”
Osório,
praça cavalariano aos 15 anos, logo teve seu batismo de fogo, nas
lutas pela Independência, na Cisplatina (1823/1824), quando foi
promovido a alferes. Emendou as campanhas, participando da guerra
contra as Províncias Unidas do Rio da Prata, combatendo com garra e
até começando a se tornar famoso, em Sarandi e Ituzaingó. Por essa
ocasião (1825/1828), Barroso também estava nessa guerra; mas, ao
que parece, nunca se encontraram.... Foi atuante no decênio heróico
farroupilha (1835/1845), ao lado dos imperiais; exerceu comandos de
regimento e de brigada e atingiu o posto de tenente-coronel.
Cessada
a guerra civil, permaneceu em serviço, entremeando períodos de
licença, principalmente para atender à sua família, de vida muito
modesta e sacrificada. Vindo a guerra contra Oribe e Rosas
(1851/1852), lá estava Osório comandando o seu 2o Regimento de
Cavalaria, que teria assinalado papel na Batalha de Caseros, onde foi
promovido a coronel, por bravura. Outro interregno de atividades em
guarnições do Rio Grande e novamente na guerra. Na Campanha do
Uruguai (1864/1865) e na do Paraguai (1865/70), foi comandante de
divisão e do nosso Exército em operações, e de corpos de Exército
nas fases pesadas da grande guerra. Sempre presente, sempre
decidindo, sempre celebrado, famoso e amado. Um homem providencial.
Passo da Pátria, Tuiuti, Avaí, Peribebuí, são gemas da sua coroa.
PERSONALIDADES
Barroso
era muito austero. Era um tanto rude, pouco acessível e, portanto,
nada simpático. Disciplinador rigoroso, entretanto justo. Em suas
funções, quaisquer que fossem, era organizado, meticuloso,
detalhista se a questão requeria. Partes, relatórios, orais ou
escritos, recomendava que fossem curtos, precisos, sem floreios;
continha os excessos deles – os verbais, parando-os, e os escritos,
restituindo-os com exigências de maior objetividade. Em geral, não
era querido. Porém, era muito considerado. Tudo nele impunha natural
respeito: de estrutura mediana, corado, olhos azuis, ereto, bem
fardado, tinha aparência e comportamento que lhe davam boa fama.
Mas,
querido certamente não era, devido à excessiva rigidez no trato, em
serviço e fora dele. Isso, antes de Riachuelo... Antonio Luis von
Hoonholtz, Almirante Barão de Tefé, que comandava a Canhoneira
Araguari em Riachuelo, discursando em 11 de junho de 1908 (quando foi
depositada a urna mortuária de Barroso na cripta do monumento a ser
inaugurado na Praia do Russel, no Rio), confessou que somente durante
a batalha – não anteriormente... – admirou, surpreendido, a
atitude de liderança do seu chefe-de-divisão: calmo, impávido,
sempre no convés do capitânia, barbas ao vento. E aquele tenente,
apreciando seu comandante, jamais se esqueceria da cena majestosa; e
só então passou a vê-lo, a Barroso, com simpatia, porque ali o
vira como um “símbolo da verdadeira coragem”.
Osório
era um homem simples; bonachão, sem ser relaxado. Nisso, o jovem
oficial trupiê foi como seria, mais tarde, o maduro General. Era
afável, humano, cativante; simpático naturalmente. Disciplinava os
transgressores, se possível, pelo aconselhamento, mas, com a
recomendação: “e não repita...” Era muito, muito querido. Mais
até: era idolatrado. Esse sentimento, com que de cora- ção o
brindavam seus comandados, acabou por contagiar o povo brasileiro
(não apenas os gaúchos), que dele fez o seu herói militar
prototípico. Dionísio Cerqueira, que foi general honorário e
ministro da Guerra (interino, 1896), escritor do belíssimo livro
Reminiscências da Campanha do Paraguai, narrando a invasão do
Paraguai pelo Passo da Pátria, em 16 de abril de 1866, uma exitosa
operação anfíbia de transposição do Rio Paraná, refere-se ao
General Osório, o comandante do Exército Brasileiro.
Osório,
já marechal-de-campo, desceu do navio-transporte e logo se foi terra
a dentro, com seu piquete de cavalarianos e seguido, em
marche-marche, pelo batalhão de Deodoro da Fonseca a respaldá-lo.
Diz textualmente Dioníso: “Depois de realizados os grandes feitos
vem sempre a crítica mordaz, ... Foi o que aconteceu a Osório, o
imortal, o ídolo do Exército, que o amava porque via sempre a
glória cintilando na ponta da sua lança legendária.
Acusam-no
por ter-se arriscado temerariamente num reconhecimento à viva força,
à frente de poucos homens, quando dependia de sua vida o bom êxito
da operação...... Osório avançou na frente e foi o primeiro a
pisar a terra paraguaia! ‘Fez mal’! – dizem os críticos frios.
‘Fez muito bem’! – exclamam os soldados entusiasmados do
Exército que ele conduziu à vitória.... Nesse dia memorável, o
General firmou a conquista do coração do seu Exército. Todos o
amavam, por sabê-lo generoso e bravo e que ele não sentia desdouro
em lhes dirigir palavras de afeto, quando passava pelos fogões dos
bivaques, nas rondas de comandante-em-chefe.
Nesse
dia, Osório fez-se o batedor da estrada da glória, para dar exemplo
às suas tropas.” E diz também: “Nada sugestiona tanto a alma do
soldado como esses atos de temerário heroísmo, consagrado pela
vitória. Desde então, Osório assumiu proporções
extraordinárias... Quando passava, envolto no pala, deixando ver a
gola bordada da farda, com um ar risonho e bom, todos o aclamavam.
Acho que foi a primeira vez que o nosso comandante recebeu vivas dos
seus soldados, fascinados por ele”.
Barroso
e Osório mantiveram-se autênticos – através da vida, no desfiar
da carreira – em seu modo de ser, de proceder, de conviver. Ambos
foram modelares, em momentos cruciais. Todavia, não há dúvida de
que seus pontos culminantes pairaram, exatamente, nas batalhas
fundamentais – Riachuelo, Tuiuti – como que historicamente
irmanadas em um mesmo e profundo sentido de grandiosa definição de
valores, de inexorável demarcação de rumos. Naquelas batalhas, os
chefes supremos agiram como figuras notáveis de homens, guerreiros,
líderes.
Barroso
caracterizou-se por iniciativa, ousadia, coragem; sobre tudo, por
criatividade. Estando o inimigo mais forte e apoiado de terra, e em
posição mais favorá- vel após quatro horas de luta sem trégua,
impunha-se um gesto audaz, surpreendente. Teve-o Barroso, inspirado e
consciente, jogando violentamente a Amazonas contra alguns navios
paraguaios e literalmente os escangalhando com a roda-de-proa; e
assim, dando novo e maior alento à nossa Força Naval e fazendo que,
pouco depois, o restante da força paraguaia fugisse rio acima, numa
comprovação de derrota.
E
tão completa foi ela, que o próprio Osório, em ofício ao
Almirante Tamandaré, diria: “tenho profunda convicção de que a
Marinha salvou a causa da Aliança em 11 de junho” (6 novembro de
1866). 5. Osório, em Tuiuti, desdobrou-se no comando da defesa.
Acorria a toda parte, providenciando reforços, substituições de
tropas, mandando tamponar brechas, enquanto pessoalmente combatia, a
ponto de ser ferido por bala e lhe morrer uma montaria. Osório não
era um estrategista, e sabia disto; ele era, sim, um inato comandante
tático, que dosava por instinto, ousadia e prudência, e era nisso
insuperável.
Mais
de três decênios depois (em 1900), discursando no Círculo Militar
de Buenos Aires, o historiador argentino Garmendia diria que, como se
esperava de um verdadeiro chefe, Osório “conhecia o coração dos
seus soldados”. Conhecia, sim. Conta-nos o General Dioniso, no
livro citado, que “tínhamos, felizmente, à nossa frente, o grande
Osório, que surgia como um semideus, nos momentos mais críticos.
Ouvi – e narro com ufania – (ouvi) soldados feridos ...
levantarem-se a meio ... e murmurarem... quando ele passava: Viva o
General Osório! Viva Osório!”
Foge
ao escopo deste trabalho tratarmos das duas batalhas, Riachuelo e
Tuiuti – dos primórdios, do meio físico, das forças em presença,
do desenrolar, da finalização, das conseqüências todas. Haveria
muita coisa a dizer. Em abordagens específicas, ainda mais
cresceriam os vultos de Barroso e Osório, os condutores das
esplêndidas vitórias. O Brasil reconheceu os méritos de ambos.
Barroso, por ato imperial de 3 janeiro de 1866, quando já era Chefe
do Estado-Maior da Esquadra, no Prata, foi distinguido com o título
de Barão do Amazonas, com grandeza, em sua vida.
E
Osório, que vinha de longa campanha e comandava nosso Exército, na
Tríplice Aliança, bem na manhã de 24 de maio – que bonito acaso!
– recebera a notícia de sua ascensão a Barão do Herval, com
grandeza. Um fato significativo, que tem escapado à observação dos
historiadores militares, é que o primeiro regulamento para o
Imperial Colégio Militar (de 9 de março de 1889), no referente a
premiações, estabelecia as seguintes medalhas de ouro, que caberiam
aos alunos mais bem classificados, ao final do curso (nesta ordem):
1. Duque de Caxias; 2. Almirante Barroso (não Barão do Amazonas);
3. Marquês do Herval (não General ou Marechal Osório); 4. Visconde
de Inhaúma ( o Almirante. J. J. Inácio, substituto de Tamandaré,
que não aparece no rol, pois ainda estava vivo); 5. Conde de Porto
Alegre.
COMO FECHO
Em
largos e rápidos traços, este é o paralelismo que entendemos
apropriado ressaltar, falando ora de um, ora do outro; vamos encerrar
com poucas considerações mais. Barroso foi brasileiro por opção.
Pronunciou-se pela nossa Independência. Serviu ao País, na Marinha,
de norte a sul do Brasil e no exterior, onde foi necessário. Sempre
e somente, foi um militar devotado. Faleceu aos 71 anos (em 8 de
agosto de 1882), em Montevidéu, onde se casara (em 1843, com D.
Carmen Alvarez) e onde, após reformado no posto de almirante, em
1873, fixara residência definitiva.
Osório
era gaúcho de costumes arraigados, radicado lá na sua província em
constante efervescência. Sempre guerreiro, sempre convocado a
servir. Também, sempre político, o que era um vício
rio-grandense... Por isso, mantinha residência no Rio, com o que
atendia às solicitações do Senado e do Ministério, representando
o seu partido, o Liberal. Faleceu no casarão da Rua Riachuelo, no
117 (hoje ocupado pela Academia Brasileira de Filosofia), em 4
outubro de 1879, aos 71 anos (no cargo de Ministro da Guerra do
gabinete Sinimbu). Note-se, praticamente na mesma idade de Barroso.
Um paralelo, sim, entre duas existências ativas, cheias de riscos e
andanças, de sucessos e de glórias; gozando, ainda em vida, do
reconhecimento nacional, em distinções
FONTE: Texto extraído da Revista Navigator V.1 Nº.:1/2005, de autoria do Exmo
Srº General-de-Exército Jonas
de Moraes Correa Neto,
o qual é membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
(IHGB)
Um comentário:
Moradora numa rua , com nome de General Osório, busquei saber mais sobre General Osório, e daí saber das muitas afinidades de meu pai e avô antes moradores desta rua . Fez um belo domingo (5/07/2020) para mim e meu pai ! , conhecer este brasileiro !
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