quarta-feira, 17 de maio de 2017

Força Expedicionária Brasileira: verás que um filho teu não foge à luta


Por: Luiz Eduardo Rocha Paiva
A Segunda Guerra Mundial marcou o início da ascensão do Brasil no cenário global. Desse modo, a Força Expedicionária Brasileira (FEB) contribuiu para a Nação perceber o quão era importante, para a segurança externa, tornar-se potência mundial, bem como colaborou para visualizar os desafios decorrentes e a importância do planejamento estratégico para a estruturação, a organização e o progresso do País. As potências da época, não sem motivos, viam o Brasil como país periférico e subdesenvolvido, cujo perfil mestiço era considerado, por preconceito, fator de fraqueza do caráter nacional.

Assim, esses países tinham um misto de benevolência e de desprezo, calcados no sentimento de superioridade, inclusive racial, o que não era exclusividade do arianismo alemão. Por tudo isso, a FEB teve de vencer vários desafios e obstáculos, como consequência:
- da demora em ser constituída e da indecisão dos EUA em transferir para a tropa estrangeira equipamentos, armamentos e recursos necessários ao próprio Exército e ao de seus aliados, já em operações;
- da falta de equipamentos e armamentos modernos para o adestramento da tropa quando ainda estava no Brasil, uma vez que esse material foi disponibilizado somente na Itália e, por vezes, há apenas alguns dias antes de nossas unidades entrarem em operações;
- do combate em teatro de operações (TO) montanhoso, cuja topografia favorecia a defesa, conduzida, magistralmente, pelo Exército Alemão, reconhecido pelos próprios aliados como o mais preparado e profissional do mundo; 

- da entrada em operações sem preparação completa, substituindo dois corpos de exército aliados, que estavam em combate há mais de um ano e que foram transferidos para o TO francês;
- de receber uma frente de 15 km, a qual deveria defender e atacar, o que significa combinar dois tipos de atitudes operacionais, na época, uma capacidade apenas de escalões superiores à Divisão de Exército, particularmente, de infantaria a pé;
- da entrada em operações contra a poderosa Linha Gótica no início do inverno, quando as operações costumavam tornar-se estabilizadas em regiões de condições climáticas extremas, e após a ofensiva anglo-americana para conquistar Bolonha ter sido detida no restante de toda a frente; e 
- de ser lançada contra o Monte Castelo, em 29 de novembro e em 12 de dezembro de 1944, pelo IV Corpo de Exército dos EUA, sem proteção de flanco e sem apoio aéreo, em função das condições climáticas, e com efetivo inferior ao exigido pelo objetivo, como alertara o Comandante da FEB.
Em síntese, houve precipitação e erro de avaliação do comando aliado sobre o poder do inimigo, o valor defensivo do terreno, o efetivo necessário para os objetivos colimados e o momento para prosseguir com ações ofensivas. Franceses, ingleses e americanos sofreram reveses quando seus exércitos, sem experiência e preparo, foram batidos em Dunquerque, na França; em Passo Kasserine, na Tunísia; na defesa das Filipinas e no Sudeste da Ásia, entre 1939 e o início de 1943. São derrotas contundentes e não infortúnios controlados como os da FEB em Monte Castelo.

No Brasil, a falta de conhecimento militar e de bom senso, o revisionismo ideológico da História e a estranha mania de alguns escritores e historiadores de denegrir as glórias da Pátria e de seus verdadeiros heróis resultaram em retratar a FEB de forma injusta e distorcida. Enfatizaram os reveses iniciais, quando ela ainda era uma força inexperiente, mas omitiram ou minimizaram as vitórias obtidas dois meses depois, quando a FEB já adquirira experiência na frente de combateValorizaram, apenas, fontes externas e desprezaram o testemunho dos irmãos brasileiros, inclusive, dos nossos correspondentes de guerra, testemunhas oculares que acompanharam a FEB. 
Há os que, de forma negativa, maldosa ou por ignorância sobre a doutrina militar, destacaram o fato de a Força Expedicionária Brasileira não ter cumprido um papel decisivo na derrota da Alemanha. Ora, a FEB era apenas uma das 69 divisões aliadas na Europa Ocidental, sendo uma das divisões do IV Corpo de Exército dos EUA. Cumpriu tarefas de acordo com sua natureza de tropa a pé (que não era blindada) e conquistou objetivos importantes para o êxito daquele Corpo de Exército. 
Seu papel era eminentemente tático e não estratégico, como não poderia deixar de ser. Superou deficiências em combates diretos com o inimigo na linha de frente, em dezembro de 1944 e janeiro de 1945, e não em campos de adestramento na retaguarda. Após a tomada de Monte Castelo, começou a destacar-se entre as forças aliadas na Itália, quando vieram as sucessivas vitórias de La Serra, Castelnuovo, Montese, Zocca e Fornovo. 

Celebrar esses triunfos não é mero ufanismo, como pensam infelizes detratores da FEB, carentes de sentimento nacional. Enaltecer os feitos dos soldados brasileiros na 2ª GM é dever de justiça para com nossos Pracinhas e valorização do civismo, da autoestima, da autoconfiança e do patriotismo, sem os quais uma nação não sobrevive. Houve erros sim, que devem ser estudados, mas nada destoante do que aconteceu com as forças de todos os países aliados do Eixo em diversas operações. 
A honestidade de propósitos revelar-se-ia ao apontar esses erros, desde que também se destacassem os acertos e as vitórias, que foram incontestáveis momentos de glória do Exército Brasileiro. Como força de nível tático, a história da FEB foi escrita, principalmente, pelas pequenas e médias frações. Sargentos, tenentes, capitães e comandantes de unidades mostraram o valor do soldado brasileiro no maior desafio do combatente: a hora da verdade, ao enfrentar o fogo inimigo com equilíbrio emocional, competência e coragem.  
Os brasileiros que amam à Pátria, particularmente, os irmãos de armas, jamais se esquecerão dos Pracinhas e os terão sempre como exemplos, conscientes de que pertencer ao Exército de Caxias é uma grande honra e um motivo de orgulho e de felicidade. É ter uma sublime missão e uma nobre razão de viver.
FONTE: EBlog
NOTA DA REDAÇÃO: O Autor do Artigo, o Srº Luiz Eduardo Rocha Paiva é General-de-brigada (R1) do Exército Brasileiros. possui Doutorado em Aplicações, Planejamento e Estudos Militares na Escola de Comando e Estado–Maior do Exército (ECEME), Mestrado em Aplicações Militares na Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais e Pós Graduação Lato Sensu em Política, Estratégia e Alta Administração Militar – Especialização, com ênfase em Estratégia, na ECEME e Pós-Graduação Lato Sensu MBA Executivo do Exército Brasileiro – Especialização, na FGV – RJ – 2000. 
Foi instrutor da Academia Militar das Agulhas Negras, da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais e da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército. Atuou como Observador Militar das Nações Unidas em El Salvador e Comandou o 5º Batalhão de Infantaria Leve (Regimento Itororó) em Lorena – SP.  
Como oficial-general foi Chefe da Assessoria Especial do Gabinete do Comandante do Exército, encarregada de implantar o Programa Excelência Gerencial do Exército, comandou a Escola de Comando e Estado-Maior e foi Secretário-Geral do Exército. Recebeu diversas condecorações nacionais e estrangeiras em 38 anos de serviço ativo. É pesquisador pela Fundação Marechal Trompowski, realizando trabalhos no Centro de Estudos Estratégicos do Exército.

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