domingo, 5 de novembro de 2017

Centro Tecnológico da Marinha de São Paulo (CTMSP) - Aramar, um dos berços da tecnologia nuclear do Brasil


Na foto: O Capitão de Mar e Guerra (EN) Sérgio Luis de Carvalho MIranda, nos recebe no interior do prédio do LABGENE e explica detalhes dos equipamentos e seu funcionamento em uma maquete.

Por: Yam Wanders.

Uma oportunidade única para poucos, conhecer o berço do programa nuclear brasileiro, que é além de um marco tecnológico de incomensurável importância para nossa estratégia de defesa nacional, mas também para todo o meio tecnológico que beneficia a vida civil brasileira.
A 120 Km da capital paulista, o complexo de Aramar é a parte industrial do Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP).  O Programa Nuclear da Marinha foi iniciado em 1979 e busca estabelecer a competência técnica para projetar, construir, operar e manter sistemas de propulsão com reatores do tipo Reator de Água Pressurizada (PWR), e produzir o seu combustível para a propulsão naval. Está dividido em dois projetos: o Projeto da Propulsão Naval (PPN) e o Projeto do Ciclo do Combustível Nuclear (PCCN).
Vale ressaltar sempre que, todos os projetos são para fins pacíficos e atendem a altos requisitos de segurança em todas suas atividades.


No centro da planta de Aramar estão sendo implantadas as principais oficinas, usinas, laboratórios e protótipos desenvolvidos. Entre eles, o Laboratório de geração de Energia Nucleo-Elétrica (LABGENE), que será uma instalação experimental, em terra, de uma planta de propulsão nuclear.
Montagem do casco do compartimento de turbinas a vapor do bloco 30, foto do mês de abril. Por questões de segurança o atual estado do bloco  não pode mais ser mostrado. Foto via Marinha do Brasil.

Em meu parco conhecimento, sempre imaginei que para entrar em uma instalação nuclear eu necessitaria de roupas especiais e medidores de radiação, mas estava muito enganado, além das medidas de segurança serem muito elevadas em todos os sentidos, as atividades de um centro de pesquisa e desenvolvomento como esse são bem diversificadas e criteriosas, o que pode deixar qualquer visitante muito bem à vontade no local.

Desenvolvimento para a região de Aramar 

O CTMSP conta com duas unidades: na primeira, em um prédio dentro da Universidade de São Paulo (USP), estão alguns laboratórios e a área de projetos; já no Centro Experimental Aramar, localizado no município de Iperó, estão as instalações de teste e industriais, além de outros laboratórios e oficinas especializadas.
Maquete que detalha a organização do complexo e suas futuras instalações que proverão o aumento de capacidade ao complexo nos próximos anos.

O Centro Experimental Aramar ocupa uma área de 840 hectares (840 mil metros quadrados), em um terreno cedido para a Marinha, vizinho a uma reserva florestal do Ibama gerida pelo Instituto Chico Mendes. A localização trouxe benefícios para a região, como demonstrou o estudo de impacto ambiental Aramar, a presença do aparato militar da Marinha do Brasil ajudou na preservação da fauna, inibindo a caça ilegal e predatória. Aramar funciona como uma grande barreira entre a reserva florestal e o mundo exterior, representado pela rodovia que passa na região.
Quando o Centro Experimental Aramar foi instalado, em 1985, a ligação entre Iperó a Sorocaba, distantes cerca de 30 quilômetros, era feita por uma estrada de terra, que ficava intransitável quando chovia intensamente. Muitos lembram que, algumas vezes, em dias de chuva, eram obrigados a fazer a pé um trajeto de cerca de 800 metros para chegar até a entrada Aramar, uma vez que todos os carros atolavam na lama da estrada. A partir de uma demanda do Centro junto ao governo do estado de São Paulo, a estrada foi asfaltada, facilitando o deslocamento dos moradores da região entre os dois municípios. Hoje, devido ao tráfego intenso, a população já pleiteia a duplicação da rodovia.
O prédio do LABGENE, já em estado bem avançado e cumprindo todas as exigências de segurança do projeto.
Além da proteção ao meio ambiente e de contribuir para a construção da rodovia, a presença do Centro Experimental Aramar traz outros benefícios socioeconômicos para a região. O principal deles é a geração de empregos. O centro possui 900 funcionários concursados. Isso significa 900 empregos diretos para pessoas da região e também para as pessoas de fora. O Centro atraiu engenheiros e outros profissionais especializados, do Rio de Janeiro e de São Paulo, que se fixaram, montaram residências e investiram no mercado local, movimentando a economia local.
A maior parte da mão de obra é constituída por profissionais locais, formados pelas escolas técnicas da região, que receberam grande impulso com a demanda do Centro. Além disso, Aramar promove um programa intensivo de treinamento de funcionários. Nos últimos três anos, foram cumpridas 45 mil horas de treinamento, num investimento de cerca de R$ 2 milhões.


A montagem do condensador principal é mais um importante passo para o projeto e construção da planta nuclear de geração de energia e propulsão naval envolvendo militares e civis, contando inclusive com a participação da Amazul.

O número de profissionais contratados do Centro Experimental Aramar deverá aumentar, à medida que avance o projeto Labgene, que tem previsão de comissionamento para 2016. Serão contratados mais 150 engenheiros e técnicos altamente especializados, que formarão um grupo inteiramente dedicado ao projeto. Atualmente, estão sendo realizadas as obras civis nos quatro prédios nucleares, dentre eles o do reator. Diversos equipamentos já foram entregues, enquanto outros encontram-se em fabricação e testes.
Outro impacto positivo para a região é o alto índice de nacionalização do Programa Nuclear da Marinha, de 88%. “São insumos e serviços gastos no Brasil. Mesmo uma obra civil - e nós temos muitas - demanda a contratação de um grande número de pessoas da região. Como Iperó é um município com 28 mil habitantes, o reflexo é significativo.

Conhecimento

Com mais de 25 anos de presença em Iperó, o CTMSP desenvolve ações que estreitam o relacionamento com a população local. Nesse sentido, embora sem contar com centro de visitação semelhante ao da Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto (CNAAA), em Angra – “temos planos de construir um do mesmo porte, no futuro”, adianta o contra-almirante Pagano Junior –, o Centro está aberto a quem queira conhecê-lo. Autoridades e parlamentares são frequentemente recebidos. Há também um programa de visitação voltado para a comunidade local, principalmente para escolas da região. Os alunos passam um dia no Centro, onde conhecem as áreas de acesso comum, almoçam e, depois, assistem a palestras sobre meio ambiente, energia nuclear, o PNM e a Marinha Brasileira. São recebidos cerca de 2 mil visitantes/ano.

Além de receber visitas, o CTMSP vai ao encontro dos estudantes, através do Programa Cisne Branco, criado pela Marinha. A iniciativa compreende a visitação e realização de palestras em escolas, além da promoção de um concurso de redação, com prêmios para as melhores.
Outro braço de interação com a comunidade é a Fundação Pátria, criada conjuntamente pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a Marinha e a Prefeitura Municipal de Iperó. Por meio dela, são promovidos cursos técnicos de curta duração, tais como o de chapeamento para conformação de dutos de ar condicionado e o de medidas elétricas. Foi instituído, também, um prêmio para os melhores alunos da 5ª e da 8ª série da rede municipal do ensino público de Iperó. Indicados pela Secretaria Municipal de Educação, os vencedores recebem, cada um, um computador. “Com isso, buscamos estimular o estudo, mostrar sua importância. É um investimento que tem um grande retorno”, afirma o superintendente do PNM.

Transferência de tecnologia

Grande parte dos procedimentos e normas de segurança hoje existentes pela indústria de alta tecnologia tiveram origem na indústria nuclear, que sempre adotou requisitos muito severos de garantia de qualidade e formalidade técnica. De sua parte, o CTMSP tem contribuído para a disseminação desses requisitos e, com isso, para elevar o nível de qualidade dos equipamentos, materiais e projeto fornecidos pela indústria nacional. O contra-almirante Pagano Junior cita o exemplo da área de análise sísmica. “No Brasil, não é exigido da construção civil a realização de estudos de resistência a sismos para estruturas prediais. No entanto, por ser um requisito básico da indústria nuclear, foi preciso desenvolvê-lo aqui. Hoje, contamos com empresas que possuem essa capacidade de cálculo e previsão”, afirma.

Participação no RMB-Reator Multipropósito Brasileiro.

Segundo o contra-almirante Pagano Junior, a Marinha considera o empreendimento Reator Multipropósito Brasileiro (RMB) um grande salto tecnológico na busca da independência para a fabricação de radiofármacos. Integra também o esforço de qualificação de combustíveis avançados para a propulsão de meios navais, pela capacidade que terá na realização de testes e ensaios de materiais sob os efeitos da irradiação.



A Marinha tem colaborado com o projeto do Reator Multipropósito Brasileiro, por meio do CTMSP, oferecendo a infraestrutura do Centro Experimental Aramar, a documentação do Projeto de Concepção do Reator de Teste de Materiais (Retema), uma antiga aspiração do CTMSP na construção desse tipo de reator; e a colaboração do seu corpo técnico no apoio à concepção do projeto e de sua fiscalização, em especial na área de pós-irradiados e na análise rádio ecológica. “O RMB tem três grandes propósitos. Consideramos o primeiro, a geração de radioisótopos para a medicina nuclear, fundamental para o desenvolvimento social do país. No entanto, nosso interesse específico está nos outros dois propósitos do empreendimento, o ensino e o teste de materiais, que consideramos fundamentais para o futuro do programa nuclear da Marinha”, diz.

Curso de engenharia nuclear

Imagem via CTMSP/Marinha do Brasil.
A parceria entre o CTMSP e a Universidade de São Paulo (USP), com o intuito de formar e aperfeiçoar recursos humanos para o setor tecnológico e industrial brasileiro, será reforçada a partir da criação do curso de graduação em engenharia nuclear, que está em análise na universidade. O Centro ofereceu uma área de 350 mil metros quadrados dentro de Aramar para a construção de um campus avançado da universidade. 


Na visão dos integrantes do CTMSP, o futuro reservado a Aramar é se tornar um grande polo tecnológico. “Com o RMB e a USP, formamos um conjunto de atividades sinergéticas e com grande simbiose, trabalhando para o desenvolvimento do estado brasileiro”, completa.

Referências bibliográficas: Publicações da Marinha do Brasil & Revista Brasil Nuclear 41(2013), artigo de Vera Dantas; CTMSP: impactos positivos para a região de Iperó.

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