Na foto: O Capitão de Mar e Guerra (EN) Sérgio Luis de Carvalho MIranda, nos recebe no interior do prédio do LABGENE e explica detalhes dos equipamentos e seu funcionamento em uma maquete. |
Por: Yam Wanders.
Uma oportunidade única para poucos, conhecer o berço do programa nuclear brasileiro, que é além de um marco tecnológico de incomensurável importância para nossa estratégia de defesa nacional, mas também para todo o meio tecnológico que beneficia a vida civil brasileira.
A 120 Km da capital paulista, o complexo de Aramar é a parte industrial do Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP). O Programa Nuclear da Marinha foi iniciado em 1979 e busca estabelecer a competência técnica para projetar, construir, operar e manter sistemas de propulsão com reatores do tipo Reator de Água Pressurizada (PWR), e produzir o seu combustível para a propulsão naval. Está dividido em dois projetos: o Projeto da Propulsão Naval (PPN) e o Projeto do Ciclo do Combustível Nuclear (PCCN).
Vale ressaltar sempre que, todos os projetos são para fins pacíficos e atendem a altos requisitos de segurança em todas suas atividades.
No centro da planta de Aramar estão sendo implantadas as principais oficinas, usinas, laboratórios e protótipos desenvolvidos. Entre eles, o Laboratório de geração de Energia Nucleo-Elétrica (LABGENE), que será uma instalação experimental, em terra, de uma planta de propulsão nuclear.
Montagem do casco do compartimento de turbinas a vapor do bloco 30, foto do mês de abril. Por questões de segurança o atual estado do bloco não pode mais ser mostrado. Foto via Marinha do Brasil. |
Em meu parco conhecimento, sempre imaginei que para entrar em uma instalação nuclear eu necessitaria de roupas especiais e medidores de radiação, mas estava muito enganado, além das medidas de segurança serem muito elevadas em todos os sentidos, as atividades de um centro de pesquisa e desenvolvomento como esse são bem diversificadas e criteriosas, o que pode deixar qualquer visitante muito bem à vontade no local.
Desenvolvimento para a região de Aramar
O CTMSP conta com duas unidades: na primeira, em um prédio dentro da Universidade de São Paulo (USP), estão alguns laboratórios e a área de projetos; já no Centro Experimental Aramar, localizado no município de Iperó, estão as instalações de teste e industriais, além de outros laboratórios e oficinas especializadas.
Maquete que detalha a organização do complexo e suas futuras instalações que proverão o aumento de capacidade ao complexo nos próximos anos. |
O Centro Experimental Aramar ocupa uma área de 840 hectares (840 mil metros quadrados), em um terreno cedido para a Marinha, vizinho a uma reserva florestal do Ibama gerida pelo Instituto Chico Mendes. A localização trouxe benefícios para a região, como demonstrou o estudo de impacto ambiental Aramar, a presença do aparato militar da Marinha do Brasil ajudou na preservação da fauna, inibindo a caça ilegal e predatória. Aramar funciona como uma grande barreira entre a reserva florestal e o mundo exterior, representado pela rodovia que passa na região.
Quando o Centro Experimental Aramar foi instalado, em 1985, a ligação entre Iperó a Sorocaba, distantes cerca de 30 quilômetros, era feita por uma estrada de terra, que ficava intransitável quando chovia intensamente. Muitos lembram que, algumas vezes, em dias de chuva, eram obrigados a fazer a pé um trajeto de cerca de 800 metros para chegar até a entrada Aramar, uma vez que todos os carros atolavam na lama da estrada. A partir de uma demanda do Centro junto ao governo do estado de São Paulo, a estrada foi asfaltada, facilitando o deslocamento dos moradores da região entre os dois municípios. Hoje, devido ao tráfego intenso, a população já pleiteia a duplicação da rodovia.
O prédio do LABGENE, já em estado bem avançado e cumprindo todas as exigências de segurança do projeto. |
Além da proteção ao meio ambiente e de contribuir para a construção da rodovia, a presença do Centro Experimental Aramar traz outros benefícios socioeconômicos para a região. O principal deles é a geração de empregos. O centro possui 900 funcionários concursados. Isso significa 900 empregos diretos para pessoas da região e também para as pessoas de fora. O Centro atraiu engenheiros e outros profissionais especializados, do Rio de Janeiro e de São Paulo, que se fixaram, montaram residências e investiram no mercado local, movimentando a economia local.
A maior parte da mão de obra é constituída por profissionais locais, formados pelas escolas técnicas da região, que receberam grande impulso com a demanda do Centro. Além disso, Aramar promove um programa intensivo de treinamento de funcionários. Nos últimos três anos, foram cumpridas 45 mil horas de treinamento, num investimento de cerca de R$ 2 milhões.
O número de profissionais contratados do Centro Experimental Aramar deverá aumentar, à medida que avance o projeto Labgene, que tem previsão de comissionamento para 2016. Serão contratados mais 150 engenheiros e técnicos altamente especializados, que formarão um grupo inteiramente dedicado ao projeto. Atualmente, estão sendo realizadas as obras civis nos quatro prédios nucleares, dentre eles o do reator. Diversos equipamentos já foram entregues, enquanto outros encontram-se em fabricação e testes.
Outro impacto positivo para a região é o alto índice de nacionalização do Programa Nuclear da Marinha, de 88%. “São insumos e serviços gastos no Brasil. Mesmo uma obra civil - e nós temos muitas - demanda a contratação de um grande número de pessoas da região. Como Iperó é um município com 28 mil habitantes, o reflexo é significativo.
Conhecimento
Com mais de 25 anos de presença em Iperó, o CTMSP desenvolve ações que estreitam o relacionamento com a população local. Nesse sentido, embora sem contar com centro de visitação semelhante ao da Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto (CNAAA), em Angra – “temos planos de construir um do mesmo porte, no futuro”, adianta o contra-almirante Pagano Junior –, o Centro está aberto a quem queira conhecê-lo. Autoridades e parlamentares são frequentemente recebidos. Há também um programa de visitação voltado para a comunidade local, principalmente para escolas da região. Os alunos passam um dia no Centro, onde conhecem as áreas de acesso comum, almoçam e, depois, assistem a palestras sobre meio ambiente, energia nuclear, o PNM e a Marinha Brasileira. São recebidos cerca de 2 mil visitantes/ano.
Além de receber visitas, o CTMSP vai ao encontro dos estudantes, através do Programa Cisne Branco, criado pela Marinha. A iniciativa compreende a visitação e realização de palestras em escolas, além da promoção de um concurso de redação, com prêmios para as melhores.
Outro braço de interação com a comunidade é a Fundação Pátria, criada conjuntamente pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a Marinha e a Prefeitura Municipal de Iperó. Por meio dela, são promovidos cursos técnicos de curta duração, tais como o de chapeamento para conformação de dutos de ar condicionado e o de medidas elétricas. Foi instituído, também, um prêmio para os melhores alunos da 5ª e da 8ª série da rede municipal do ensino público de Iperó. Indicados pela Secretaria Municipal de Educação, os vencedores recebem, cada um, um computador. “Com isso, buscamos estimular o estudo, mostrar sua importância. É um investimento que tem um grande retorno”, afirma o superintendente do PNM.
Transferência de tecnologia
Grande parte dos procedimentos e normas de segurança hoje existentes pela indústria de alta tecnologia tiveram origem na indústria nuclear, que sempre adotou requisitos muito severos de garantia de qualidade e formalidade técnica. De sua parte, o CTMSP tem contribuído para a disseminação desses requisitos e, com isso, para elevar o nível de qualidade dos equipamentos, materiais e projeto fornecidos pela indústria nacional. O contra-almirante Pagano Junior cita o exemplo da área de análise sísmica. “No Brasil, não é exigido da construção civil a realização de estudos de resistência a sismos para estruturas prediais. No entanto, por ser um requisito básico da indústria nuclear, foi preciso desenvolvê-lo aqui. Hoje, contamos com empresas que possuem essa capacidade de cálculo e previsão”, afirma.
Participação no RMB-Reator Multipropósito Brasileiro.
Segundo o contra-almirante Pagano Junior, a Marinha considera o empreendimento Reator Multipropósito Brasileiro (RMB) um grande salto tecnológico na busca da independência para a fabricação de radiofármacos. Integra também o esforço de qualificação de combustíveis avançados para a propulsão de meios navais, pela capacidade que terá na realização de testes e ensaios de materiais sob os efeitos da irradiação.
A Marinha tem colaborado com o projeto do Reator Multipropósito Brasileiro, por meio do CTMSP, oferecendo a infraestrutura do Centro Experimental Aramar, a documentação do Projeto de Concepção do Reator de Teste de Materiais (Retema), uma antiga aspiração do CTMSP na construção desse tipo de reator; e a colaboração do seu corpo técnico no apoio à concepção do projeto e de sua fiscalização, em especial na área de pós-irradiados e na análise rádio ecológica. “O RMB tem três grandes propósitos. Consideramos o primeiro, a geração de radioisótopos para a medicina nuclear, fundamental para o desenvolvimento social do país. No entanto, nosso interesse específico está nos outros dois propósitos do empreendimento, o ensino e o teste de materiais, que consideramos fundamentais para o futuro do programa nuclear da Marinha”, diz.
Curso de engenharia nuclear
Imagem via CTMSP/Marinha do Brasil. |
Na visão dos integrantes do CTMSP, o futuro reservado a Aramar é se tornar um grande polo tecnológico. “Com o RMB e a USP, formamos um conjunto de atividades sinergéticas e com grande simbiose, trabalhando para o desenvolvimento do estado brasileiro”, completa.
Referências bibliográficas: Publicações da Marinha do Brasil & Revista Brasil Nuclear 41(2013), artigo de Vera Dantas; CTMSP: impactos positivos para a região de Iperó.
Referências bibliográficas: Publicações da Marinha do Brasil & Revista Brasil Nuclear 41(2013), artigo de Vera Dantas; CTMSP: impactos positivos para a região de Iperó.
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