Por: Redação OD
Embora
seja considerado o menor e mais superficial entre os principais
oceanos do mundo, o Ártico se encontra no centro de uma das grandes
disputas geopolíticas da atualidade e pode ser usado pelo
presidente russo, Vladimir Putin, como instrumento de barganha para o
cancelamento de sanções impostas pelo ocidente. Isso porque as
geleiras que cobrem a região vêm se derretendo com o aquecimento
global, o que dá origem a novas rotas marítimas que podem ser
exploradas comercialmente. O professor Vicente Ferraro, do
Laboratório de Estudos da Ásia do Departamento de História da USP
(Universidade de São Paulo), explica quais fatores fazem do o Ártico
um oceano tão importante no cenário internacional atualmente.
Primeiro,
acredita-se que o Ártico concentre até 20% das reservas de petróleo
ainda não descobertas no mundo e 30% das de gás natural. Em segundo
lugar, há uma questão logística importante: com o aquecimento
global, as geleiras que cobrem o local estão se derretendo e dando
origem a uma rota mais curta e economicamente mais viável para os
navios asiáticos chegarem à Europa. Dos países presentes na
região, a Rússia é o que possui maior quantidade de navios
quebra-gelo, capazes de navegar em águas congeladas, o que garante
aos russos uma vantagem comparativa no equilíbrio de poder ali.
Águas
internacionais sem regulação
Situado
no extremo norte do globo terrestre, o Ártico abrange uma área de
14.060.000 km² e é cercado por oito países: Canadá, Estados
Unidos, Noruega, Suécia, Finlândia, Rússia, Dinamarca e
Islândia. Como o gelo presente ali causava dificuldades de
navegação e povoamento no passado, não houve disputas
internacionais sobre a região e não há regulação relativa ao
tema no âmbito do Direito Internacional Público. O que existe,
segundo Bento Paulos Cabral, do Centro de Estudos Estratégicos do
Exército brasileiro, é o Conselho do Ártico, um fórum
intergovernamental que discute questões relativas à proteção
ambiental e às possibilidades de desenvolvimento no oceano.
O
Conselho do Ártico é formado pelos oito países que cercam o oceano
e conta ainda com observadores como Alemanha, Reino Unido e França.
Embora faça parte do fórum, a Rússia vem exercendo,
unilateralmente, as iniciativas militares e comerciais ali, onde
domina a navegação desde os tempos da União Soviética. O que se
vê nos últimos anos é um significativo investimento em capacidades
militares pelo país. Esses investimentos incluem o desenvolvimento e
a aquisição de materiais e armamentos adaptados para o emprego em
temperaturas fortemente negativas, mísseis de defesa antiaérea,
veículos blindados de combate e helicópteros, além do
estabelecimento de bases militares.
Discrepância
entre países
As
últimas informações divulgadas pelas autoridades russas dão conta
de que o país possui pelo menos 40 navios quebra-gelo para desbravar
o Ártico e seis deles com capacidades nucleares. Os Estados Unidos,
por sua vez, têm apenas duas embarcações do tipo. “Recentemente,
o atual Secretário de Estado americano, Rex Tillerson, reconheceu
que os EUA estão defasados nessa questão. Ele disse que o país
pretende aumentar sua presença militar e capacidade de operar dentro
do Ártico”, explica Ferraro. Para o especialista da USP, as
próximas discussões geopolíticas acerca do tema devem envolver
embates entre dois grandes grupos: um liderado pelos EUA, que deve
defender a internacionalização do Ártico e a ideia de que o oceano
não pertence a ninguém; e outro liderado pela Rússia, junto de
países como Dinamarca e Noruega, com interesses mais concretos de
exploração da região.
Esse
primeiro grupo está mais ligado à plataforma ambiental, às
questões de proteção da região e do aquecimento global; o segundo
tem interesses mais concretos de ocupação, geração de recursos e
delimitação de territórios. Ferraro pondera, entretanto, que
é improvável que qualquer debate evolua para um conflito armado até
porque a presença militar da Rússia no Ártico existia desde a
época da União Soviética, na Guerra Fria. Para o pesquisador, é
mais possível que Putin use seu poder militar na região como
instrumento político.
Eu acredito que o Putin deve usar essa
questão para reafirmar o nascimento da Rússia como uma potência
mundial. As bases militares russas no Ártico tinham sido abandonadas
e desativadas, sua capacidade foi retomada por Putin para aumentar as
vantagens comparativas do país na região. Além disso, a Rússia
hoje enfrenta duras sanções do ocidente por conta da guerra com a
Ucrânia, contra quem iniciou uma guerra em 2014. O país pode usar
esse poder no oceano como barganha para negociar um eventual
cancelamento dessas sanções. Nesse contexto, talvez seja mais
interessante para o ocidente cooperar com a Rússia do que entrar em
uma situação de concorrência.
FONTE: R7
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