Líder norte-coreano, Kim Jong-Un, acompanha lançamento de míssil (Foto: KCNA via KNS/AFP) |
Por: Redação OD
"Estamos comprometidos com a desnuclearização da península da Coreia, em sintonia com a vontade do outrora presidente Kim Il-sung e do secretário Kim Jong-il." As palavras do líder norte-coreano, Kim Jong-un, durante encontro com o presidente da China, em Pequim, surpreenderam muita gente. Apesar dos gestos de aproximação da Coreia do Norte, que tem reuniões previstas com os presidentes da Coreia do Sul e dos Estados Unidos, a comunidade internacional ainda está cética. Mas como começou a corrida armamentista na península coreana? A insegurança atual está diretamente relacionada a um episódio pouco conhecido hoje em dia: a chegada à península coreana das primeiras armas nucleares norte-americanas. Uma nuclearização que, como destaca o jornalista norte-americano Walter Pincus, ocorreu em clara violação ao acordo que pôs fim aos conflitos da Guerra da Coreia.
'Segredo sujo'
Assinatura do armistício em Panmunjom |
"Muitos americanos criticam a possível reunião entre Trump e Kim Jong-un com o argumento de que a Coreia do Norte violou vários acordos de não propagação de armas", disse Pincus num artigo publicado no jornal The New York Times. "Mas estes céticos deveriam se lembrar que foi os Estados Unidos que romperam o Acordo de Armistício da Coreia, de 1953, quando o governo Eisenhower enviou, em 1958, as primeiras armas nucleares para a Coreia do Sul." De acordo com o ex-repórter do The Washington Post, em meados da década de 1960, o arsenal nuclear dos EUA na península coreana já somava 900 projéteis de artilharia, bombas táticas, foguetes, mísseis antiaéreos e minas terrestres. "Havia, inclusive, projéteis nucleares para canhões baseados na Coreia do Sul", diz Pincus, que está escrevendo um livro sobre o tema.
Tudo
isso em violação clara do acordo assinado entre as tropas das
Nações Unidas, comandadas pelos EUA, e os exércitos da China e da
Coreia do Norte - que proibia expressamente a chegada de novos tipos
de armas e munições à península. Segundo Joseph Bermudez Jr.,
especialista do Instituto Coreia-EUA, da Universidade John Hopkins,
foi justamente o temor da chegada de armas americanas que permitiu a
assinatura do armistício. Desde então, o "perigo de que armas
norte-americanas pudessem ser usadas contra o regime do Norte
orientou o pensamento do país e suas ações estratégicas",
afirma. E a chegada de armas nucleares à Coreia do Sul - onde
permaneceram até 1991- muito provavelmente fortaleceu o desejo de
Pyongyang de providenciar seu próprio arsenal atômico.
Ogivas
por soldados
No
final da década de 1950, a Coreia do Norte ainda estava muito
distante de conseguir desenvolver armas nucleares. Mas o governo dos
EUA estava inquieto com os custos de proteger a Coreia do Sul contra
o Norte utilizando soldados norte-americanos. A lógica do governo
Eisenhower foi a de que o envio de armas nucleares à península
possibilitaria reduzir o número de soldados americanos na Ásia e o
apoio financeiro dos EUA às tropas sul-coreanas, que alcançava US$
650 milhões por ano. Foi
esta a decisão que o presidente tomou, embora documentos da época
revelem que assessores do Departamento de Estado deixaram claro que a
estratégia resultaria na "violação" dos termos do
armistício assinado cinco anos antes. O Pentágono, porém, insistiu
que o envio do armamento era "essencial" do ponto de vista
militar e argumentou que a Coreia do Norte havia violado o acordo ao
adquirir novos aviões e armas de artilharia. "É possível
argumentar que a violação dos comunistas ao parágrafo 13,
especialmente no que se refere a aviões, nos liberam para ignorar
suas restrições", diz um memorando do dia 28 de novembro de
1956.
'João
Honesto' e canhões
O
documento se refere a uma discussão sobre o possível envio à
Coreia do Sul do sistema de mísseis terra-terra MGR-1 (conhecido
como "Honest John", ou "João Honesto"), assim
como canhões de 280 mm, as primeiras armas com capacidade nuclear
consideradas pelo Departamento de Defesa americano. "De qualquer
maneira, essas armas não devem ser consideradas atômicas, porque,
quando não estão acompanhadas de ogivas nucleares, seu uso seria
potencial, não real", argumentou o Pentágono. Em
24 de dezembro de 1957, o exército dos Estados Unidos recebeu a
autorização para levar os dois tipos de armas para a Coreia do Sul,
embora o anúncio público de sua chegada à península tenha
ocorrido em 28 de janeiro de 1958. "Um porta-voz do Exército
dos EUA se recusou a dizer quantos canhões haviam chegado e se
estavam acompanhados de ogivas nucleares", recorda Pincus. Desde
então, "os Estados Unidos se esqueceram desta história e os
políticos americanos só culpam a Coreia do Norte por não respeitar
os acordos", aponta. "Mas se é verdade que Pyongyang é
pouco confiável, os líderes norte-coreanos certamente se lembram do
que aconteceu na década de 1950", concluiu o jornalista, que já
venceu um Pulitzer, o principal prêmio do jornalismo.
*Com Informações do site BBC Brasil
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