quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

Por mais áreas oceânicas totalmente protegidas


Por: Redação OD
Dotado de uma invejável extensão territorial, o Brasil frequentemente esquece que os seus domínios são ainda maiores graças à projeção de nossos cerca de 8 mil quilômetros de litoral e ilhas ao largo, numa imensa jurisdição marítima que agrega ao patrimônio – e à responsabilidade – de todos os brasileiros mais de 3,6 milhões de quilômetros quadrados de águas ainda ricas em vida, cerca de 40% de nosso território. É o que os militares batizaram de “Amazônia Azul”, em analogia aos recursos daquela região terrestre, e sua equivalência com a área marítima.

Até recentemente esse patrimônio natural era severamente negligenciado em sua gestão e conservação. Menos de 1,5% do mar brasileiro foi protegido até hoje em Unidades de Conservação. Tal fato cria embaraços internacionais ao País, ao mesmo tempo que permite que a pesca predatória provoque um colapso. Um dos maiores problemas dos oceanos, superando o aquecimento global, é a pesca predatória. Ela segue destruindo até a beira da extinção. Populações inteiras de espécies comercialmente valiosas e outras de enorme importância para a saúde dos ambientes marinhos, caso dos tubarões, são perseguidas até o extermínio. Nosso destino está inexoravelmente ligado ao mar e à navegação, só os brasileiros não sabem. Sim, o Brasil deu as costas ao mar. 

Não conhece ou valoriza a saga que nos trouxe à luz, a epopeia náutica portuguesa; e não cultiva a história marítima. Entre outras, essas são razões que explicam nossas áreas oceânicas serem tão distantes do pensamento da população e dos governantes. Elas estão ao deus-dará há décadas. Enquanto isso, seus tesouros ecológicos são saqueados, apesar do alerta de multidões de cientistas para a necessidade de preservação. Enquanto no mundo crescia a tomada de consciência sobre a importância de proteger a vida marinha, com a criação de extensas áreas preservadas, aqui as oportunidades milionárias de gerar emprego e renda com essa preservação, que vão da recomposição dos estoques pesqueiros à atração de ecoturismo de padrão internacional, seguiram ignoradas.
A roda da História girou a favor do mar brasileiro quando o presidente Michel Temer acertou na escolha de dois ministros, o do Meio Ambiente, José Sarney Filho, e o da Defesa, Raul Jungmann, cujo trabalho conjunto está trazendo à luz a oportunidade histórica de se protegerem algumas das áreas mais relevantes do mar brasileiro: os arquipélagos oceânicos de São Pedro e São Paulo e Trindade e Martim Vaz. Não apenas essas ilhas isoladas abrigam no seu entorno conjuntos únicos de espécies de peixes e invertebrados raros, endêmicos e/ou ameaçados de extinção, mas ainda as águas que as circundam abrigam muitas espécies pelágicas, de mar aberto, que a sobrepesca não conseguiu extinguir (mas poderá fazê-lo em breve se a proteção não for concretizada).

Somadas, as áreas propostas para as novas Unidades de Conservação abrangerão cerca de 900 mil km², fazendo nossa porcentagem de mar sob gestão conservacionista saltar de 1,5% para quase 25%. Com isso o Brasil cumprirá à risca seus compromissos internacionais de gestão ambiental marinha, credenciando-se a receber recursos internacionais vultosos para a sua gestão, cuja proteção, graças a esse entendimento entre ministérios, terá a participação ativa e muito bem-vinda da Marinha do Brasil, essencial à garantia de que nossa soberania ambiental não será violada por frotas e interesses estrangeiros.
O anúncio da abertura de consultas públicas para a criação dessas Áreas Marinhas Protegidas já vem atraindo enorme interesse internacional, tanto da parte da mídia como do trade de turismo e de instituições ligadas à conservação, oferecendo ao presidente Temer uma pequena amostra da repercussão positiva que a sua decretação e a implantação trarão, contribuindo, num momento crítico da nossa História, para melhorar a imagem do Brasil no conjunto das nações que aprenderam a aliar desenvolvimento e conservação do patrimônio natural.

Um único reparo a esse histórico e bem-vindo processo: as áreas propostas para Proteção Integral, onde os usos predatórios da vida marinha ficariam definitivamente vedados, não são extensas o suficiente para assegurar de fato a conservação dos valores ambientais ali existentes, em especial para afastar a sobrepesca, que tanto dano já causou a essas regiões. Por isso defendemos a ideia de que os ministros Sarney e Jungmann e o comandante da Marinha, almirante de esquadra Eduardo Bacellar Leal Ferreira, dono de extensa e bela folha de serviços prestados, encontrem um entendimento que permita levar em uníssono ao presidente a proposta de ampliar essas áreas totalmente protegidas em todo o entorno dos arquipélagos e, principalmente, aumentando a extensão para proteção integral ao redor de São Pedro e São Paulo. 
Com isso, não apenas a biodiversidade única desses locais estará protegida, mas também estarão salvaguardados os valores ambientais capazes de atrair visitantes, pesquisadores e investimentos para esses novos Monumentos Naturais em véspera de criação. Como dissemos neste espaço há um par de meses, o presidente Michel Temer está às portas de inscrever seu nome na História Ambiental do Brasil e elevar nosso país no plano internacional a uma posição de destaque nas temáticas marinhas, com reflexos favoráveis em ampla gama de foros. Ao mesmo tempo que abre oportunidades de captação de recursos e apoios para a gestão ambiental. Tudo o que precisamos, agora, é coragem política para concretizar esse grande passo. A hora de fazê-lo é agora. Chegou a hora do mar – do Mar do Brasil.
FONTE: Jornal Estadão, Por João Lara Mesquita e José Truda Palazzo Jr - Jornalista, editor do site www.marsemfim.com.br e consultor ambiental; e vice-presidente do Instituto Augusto Carneiro

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