A
aquisição da nova família de blindados revitalizou a tropa
blindada brasileira, desencadeando uma significativa mudança
cultural no trato com os blindados. Contudo, o término da vida útil
destes blindados está previsto para 2027. Findo este prazo, há duas
soluções possíveis: aplicar um kit de modernização e postergar
seu descarte ou substituí-lo por um novo carro de combate ao término
de sua vida útil. O presente artigo
teve por objetivo analisar as possíveis soluções, e
no ambito de nossa politica monetária e de defesa, sugerir
que a aquisição de um carro de combate no mercado internacional se
apresenta como a solução mais viável, mais
realista
e eficiente à substituição da frota Leopard 1A5 BR. Mas
ainda, paralelamente, sugere-se
também de se iniciar
o desenvolvimento de um carro de combate nacional.
No
início do século XXI, em face da necessidade de adequação às
exigências do combate moderno, o Governo Brasileiro empreendeu uma
nova estruturação de sua defesa. Uma série de documentos foi
normatizada, com reflexos para todo o setor, inclusive para as forças
blindadas (BRASIL, 2012 a, b, c). Com fulcro a recuperar a capacidade
operacional de sua tropa blindada, o Exército Brasileiro levou a
cabo o Projeto Leopard, que contemplou, além da aquisição das
viaturas, a aquisição de simuladores, obras de infraestrutura nas
Unidades, o suporte logístico integrado, a tradução de manuais e a
qualificação dos recursos humanos (RIBEIRO, 2012). O Projeto
revitalizou a espinha dorsal da cavalaria blindada brasileira e
atingiu os objetivos a que se propôs, pois desencadeou uma
significativa mudança cultural no trato com os blindados.
Entretanto,
o Leopard 1A5 já atingiu metade de sua vida útil e, por força de
contrato, o suporte técnico e logístico, bem como o fornecimento de
peças será descontinuado em setembro de 2027, de acordo com o
contrato de suporte logístico assinado com a Empresa
Krauss-Maffei-Wegmann (BRASIL, 2017). Conforme a legislação
vigente, nos próximos anos, a viatura será reavaliada e o Exército
decidirá por realizar um mid-life update¹
e postergar seu descarte ou substituí-la por um novo carro de
combate ao término de sua vida útil, seja ele desenvolvido em
território nacional ou adquirido no mercado internacional (BRASIL,
2016). Nesse escopo, o presente ensaio tem por objetivo analisar
estas possíveis soluções e apresentar algumas considerações
sobre o assunto.
KIT
DE MODERNIZAÇÃO
Particularmente
nos aspectos referentes à proteção e ao processo de engajamento
(ANNES, 2012). Quanto à proteção, o Leopard 1A5 possui uma
blindagem de Face Endurecida de 2ª geração²
, mais pesada e menos eficiente em relação às blindagens compostas
mais modernas. Além disso, sua blindagem é cerca de 10 vezes menos
espessa que as blindagens dos carros de combate mais novos e não
possui nenhum sistema ativo de proteção (ANNES, 2012). Quanto ao
poder de fogo, o carro manteve o canhão L7A3 raiado, de 105mm, da
empresa britânica Royal Ordnance, que proporciona um alcance bem
reduzido em relação aos canhões mais modernos (cerca de 1500m
menos que os canhões 120mm de 1ª geração e cerca de 2500m menos
que os canhões de última geração). O comandante do carro utiliza
ainda a ultrapassada luneta TRP, que é manual, tanto no giro quanto
no mecanismo para acoplamento ao canhão.
Tais
limitações impedem sua utilização com o CC em movimento, sob pena
de queimá-la e impõe ao comandante do carro transferir objetivos
manualmente. Esta luneta também não possui sistema de visão
noturna, o que compromete ainda mais a capacidade de busca, aquisição
e transferência de alvos (ANNES, 2012). A mobilidade, fruto de sua
concepção, é o ponto forte do carro. Contudo, mudanças
significativas em seus sistemas de proteção e blindagem ou em seus
sistemas de armas e controle de tiro acarretariam em aumento de peso,
o que poderia vir a comprometer esta mobilidade. A aplicação de um
kit de modernização robusto, que realmente alterasse as
características do Leopard 1A5, acarretaria em custos elevados e um
tempo considerável para planejamento, desenvolvimento e posterior
implementação.
SUBSTITUIR
POR OUTRO CARRO
A
análise prospectiva de cenário realizada pelo Pentágono para o ano
de 2035 vislumbra um crescimento permanente da influência do Brasil
nas relações internacionais (EUA, 2005). A intensificação da
projeção do Brasil no concerto das nações e sua maior inserção
em processos decisórios internacionais tornam necessário estruturar
a Defesa Nacional de modo compatível com a estatura político estratégica do País. Seguindo essa linha de raciocínio,
substituir nossos Leopard 1A5 por um carro de combate principal
moderno é algo extremamente válido. Além do efeito dissuasório,
tal alternativa permite que o País venha futuramente integrar
missões internacionais em igualdade de condições com países mais
desenvolvidos bem como participar, com propriedade, dos diversos
fóruns internacionais.
A
substituição por um carro desenvolvido internamente, com alto
índice de nacionalização seria o ideal, pois além de propiciar o
desenvolvimento da indústria nacional de defesa, tal alternativa
permite que o carro seja concebido de forma a atender as demandas
contempladas nas nossas hipóteses de emprego. Fruto da experiência
proporcionada pelo projeto Leopard, há atualmente dados disponíveis
internamente bastante precisos que nos permitiriam conceber um carro
adequado às nossas necessidades (BRASIL, 2010 b). O parque
industrial brasileiro é bastante diversificado e possui condições
tecnológicas para levar a cabo um projeto deste porte, desde que
haja vontade política. Isso pode ser confirmado ao verificarmos os
projetos ousados na área de defesa que tiveram sua gênese em
território nacional como, por exemplo, o da aeronave KC 390 (FURLAN,
2015) e o do blindado sobre rodas Guarani.
Dessa
forma, o desenvolvimento de uma viatura com tecnologia nacional não
se apresenta como uma solução imediata viável para este ciclo.
Caso a decisão seja por adquirir um carro de combate no mercado
internacional, voltamos ao estudo dos veículos desenvolvidos pelos
países supra citados. Nestes estudos verificamos que blindagem
composta, armamento principal de 120mm e optrônicos com elevada
capacidade de busca, aquisição e transferência de alvos são
algumas características comuns a tais carros de combate. Ademais,
todos estes modelos foram concebidos observando o conceito da
modularidade, podendo receber blindagens adicionais, reativas ou não,
sistemas de proteção ativos e kits modulares para missões variadas
como, por exemplo, operações em áreas urbanizadas ou em áreas com
condições climáticas extremas, dentre outras (MBT BRAZIL, 2014).
Desta
forma, acredito que no caso de uma futura aquisição, devemos buscar
um carro que possua as características que atendam a estas
tendências centrais. Outra tendência de diversos exércitos,
particularmente os membros da OTAN, é primar pela tecnologia em
relação à quantidade. Mantém uma tropa pequena (nível esquadrão
ou regimento) no estado da arte e o restante das guarnições,
dotadas de carros de combate mais modestos, dentro das possibilidades
econômicas do país. Encaram essa estratégia como uma forma de
projetar poder, uma vez que nas missões externas, prioritariamente,
empregam suas tropas no estado da arte (BRASIL, 2010 b). Tal solução
permite também que, em seus respectivos centros de treinamento,
sejam desenvolvidos estudos a respeito do que há de mais moderno,
estando, a qualquer tempo, em condições de operacionalizar
instruções e treinamentos de tropas de maiores efetivos.
CONSIDERAÇÕES
Precisamos ter o cuidado de não repetirmos os erros do passado, mantendo um carro de combate em serviço por vários anos mesmo com altos índices de indisponibilidade. Isso, além de ocasionar uma sensível perda de poder de combate, acaba por criar uma lacuna temporal na transmissão de conhecimentos e experiências no emprego de blindados. Ademais, gera uma grande desmotivação na tropa e corrói a cultura do blindado. Face ao exposto, considero que ainda que a aplicação de um kit de modernização não seja a melhor solução, tal alternativa é melhor que nada. Acredito que a aquisição de um carro de combate no mercado internacional se apresenta como a solução mais viável, realista e eficiente à substituição da frota Leopard 1A5 BR.
Uma
sugestão seria a VBC Leopard 2A4, pois além de possuir todas estas
vantagens em relação ao nosso atual carro de combate, é da mesma
família de blindados, o fabricante já possui base industrial no
País e ambos modelos guardam enorme similaridade em seus sistemas de
controle de tiro. Este último aspecto proporcionaria uma
significativa redução no tempo de adaptação das guarnições à
nova viatura. Outro argumento que reforça esta sugestão é que o
Exército já possui especialistas nesta viatura. A criação de
novos cursos, portanto, iria requerer menores esforços e custos.
Acredito, ainda, que a solução ideal seja, em paralelo, iniciar o
desenvolvimento de um carro de combate nacional.
Fonte: Revista Ação de Choque, do Centro de Instrução de Blindados, O autor do trabalho, o Srº Daniel Bernadi Annes, é Major da Arma de Cavalaria do Exército Brasileiro e atualmente é Instrutor no CI Bld
Notas do Editor:
(1)
-
É
uma modernização aplicada ao material no meio de sua vida útil com
a finalidade de ampliar suas capacidades, visando reduzir o hiato
tecnológico com as versões mais recentes e mantendo-o operativo por
mais tempo. (2)
- Blindagem
resultante da observação da dureza na resistência à penetração.
Busca a obtenção de um comportamento ótimo a partir de um
compromisso entre dureza e tenacidade. É a união metalúrgica, via
laminação, de 2 chapas de aço com características químicas
diferentes, a externa extremamente dura (mais resistente) e a interna
macia (mais tenaz), graças ao diferente teor de carbono.
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