Por: Yam Wanders.
"Arquipélago São Pedro e São Paulo, a ocupação que garante a soberania brasileira no Atlântico".
Mais que um rochedo no meio do oceano, Mais que uma ilha, mas um posto avançado de nossa "Amazônia Azul". |
Dando a continuação à matéria de semana passada sobre a missão APOIEX da Marinha do Brasil no Arquipélago de São Pedro e São Paulo, muitas questões são levantadas sobre como pesquisadores e militares podem viver em um local tão longínquo e inóspito como esses rochedos, que literalmente ficam no meio do Oceano Atlântico, a quase meio caminho entre a África e América do Sul.
A Marinha do Brasil já tem um longo e tradicional histórico de guarnecimento de postos em ilhas oceânicas em todo o nosso litoral e em além mar, como é o caso da EACAF, a base brasileira na Antártica . Mas no caso do Arquipélago de São Pedro e São Paulo, trata-se do nosso posto avançado mais distante de qualquer coisa que signifique terra firme e civilização, dados os 1100 kilômetros que separam os rochedos da costa do Brasil.
A manutenção das antenas de comunicação de telefonia e internet, uma das principais atividades dessa comissão. |
E o principal objetivo do PROARQUIPELAGO é garantir a habitabilidade permanente da remota região do ASPSP, o que propicia ao país o estabelecimento de uma Zona Econômica Exclusiva ao País de 450.000 Km2. Como a região incorpora elevado potencial para realização de pesquisas nos mais variados ramos da ciência, a habitação contínua é facultada a pesquisadores vinculados a projetos científicos previamente selecionados, para cumprir as seguintes metas(*1):
- Contribuir para a ampliação do número de projetos de pesquisa em desenvolvimento nas Ilhas Oceânicas;
- Manter a Estação Científica do ASPSP ocupada durante 365 dias por ano; e
- Criar um Projeto Piloto de Gestão Ambiental no âmbito do PROARQUIPELAGO.
A Estação nova, mais alta, forte, moderna e confortável, operacional desde 2008. |
Para permanecer nesse que é o posto de pesquisas mais distânte do nosso litoral (com exceção da Antártica), é necessário um processo criterioso de cada um que se propõe ao intento. Pois uma das exigências iniciais para tal é que somente pesquisadores com trabalhos sérios e ligados aos ramos de atividades que são essenciais para a ocupação da ilha.
Além disso, uma vez analisado e aprovado o intento do trabalho após um sério inquérito pedagógico, o pesquisador deve passar por um treinamento a nível operacional, que visa garantir a segurança de cada um e do todo que lá permanece e também com as atividades da CIRM, com as normas e os regulamentos a serem cumprindos, bem como o trabalho e comportamento sócio-humano, conhecimentos básicos sobre a conservação e manutenção da estação e operação dos diversos equipamentos lá existentes.
A Estação nova, bem mais alta. Necessidade para evitar a subida da maré e intempéries que fazem as ondas do mar atingirem facilmente as paredes da construção em dias mais tempestuosos. |
Entre as disciplinas do treinamento "Pré-Arquipélago" estão:
- Segurança, meio ambiente e conservação; pois a ilha é um ambiênte único no mundo, e deve-se respeitar todo o frágil biôma do local.
- Atividades da CIRM; a CIRM - Comissão Interministerial para os recursos do mar é a entidade que administra todas as atividades ligadas às ilhas oceânicas brasileiras sob responsabildiade da União Federal.
- Primeiros Socorros; pois o local é perigoso devido aos rochedos com pontas salientes e aos pássaros (atobás) que possuem comportamento agressivo quando incomodados, entre outros riscos.
- Dinâmica de grupos; todos devem se conhecer bem, afinal a permanência de até dois meses em um local confinado é stressante quando não se sabe conviver em harmonia.
- Combate à incêndios; a Estação científica é de madeira e os móveis são também rústicos, e dentro da estação existem diversos equipamentos elétricos.
- Atividades de mergulho; afinal muitas das pesquisas envolvem essa atividade e pode ser necessária para um resgate.
- Manutenção e operação de botes infláveis; os botes infláveis são a principal forma de transporte de embarcações maiores para o mini cais da ilha, e, o risco de uma avaria séria em caso de colisão com os rochedos é sempre iminente.
- Natação utilitária; pois os pesquisadores trbalharão em um rochedo que está sempre sujeito à súbita mudança da maré entre outras necessidades.
- Rotinas de procedimentos; a estação precisa de uma rotina de conservação, que vai desde a conservação de limpesa interna até a manutenção do desalinizador de água e a manutenção dos painéis solares que fornecem energia elétrica.
- Sobrevivência no mar; a ligação principal e mais frequente entre o continente e o arquipélago são traineiras pesqueiras fretadas pela Marinha do Brasil, que não possuem as mesmas facilidades e robustes dos navios patrulhas que fazem a ligação a cada quatro meses.
Como participar do programa (*2)
A cada três anos, em média, o CNPq publica um Edital com vistas a selecionar propostas para apoio financeiro a projetos que visem contribuir significativamente para o desenvolvimento científico e tecnológico do País, no âmbito do Programa Arquipélago de São Pedro e São Paulo. As propostas devem observar as condições específicas estabelecidas no Edital, que determina os requisitos relativos ao proponente, cronograma, recursos financeiros a serem aplicados nas propostas aprovadas, origem dos recursos, itens financiáveis, prazo de execução dos projetos, critérios de elegibilidade e demais informações necessárias. As seguintes áreas do conhecimento são, geralmente, abrangidas pelo Edital: geomorfologia, geoquímica, geofísica, petrologia, estrutura e geotectônica; circulação oceânica, interação oceano-atmosfera e clima e processos de enriquecimento local; dinâmica e contaminação da cadeia trófica; ecologia, comportamento e biodiversidade; recursos pesqueiros; impacto de ações antrópicas e recuperação de áreas degradadas.
Há, ainda, a possibilidade dos interessados apresentarem propostas de projetos diretamente à SECIRM, em qualquer época. Nesse caso, o projeto será submetido à avaliação quanto ao mérito científico e ambiental no âmbito do PROARQUIPELAGO e, sendo aprovado, não receberá qualquer tipo de apoio financeiro. Cabe ressaltar, também, que a formatação das propostas deve seguir os padrões estabelecidos pelo CNPq. As seguintes informações são obrigatórias:
- Identificação do proponente e demais participantes do projeto;
- Identificação da proposta;
- Qualificação do principal problema a ser abordado;
- Objetivos e metas a serem alcançados;
- Metodologia a ser empregada;
- Principais contribuições científicas ou tecnológicas da proposta;
- Cronograma;
- Grau de interesse e comprometimento de empresas com o escopo da proposta, se for o caso; e
- Indicação de colaboradores ou parcerias já estabelecidas com outros centros de pesquisa.
Após a aprovação do projeto de pesquisa, será necessária a habilitação dos pesquisadores para integrar as expedições científicas para o ASPSP.
A Estação Científica
A Estação Científica do Arquipélago de São Pedro e São Paulo foi inaugurada em 25 de junho de 1998. Apesar de ter se mostrado adequada às intempéries da região, com o passar dos anos, o local onde a mesma foi implantada revelou-se vulnerável ao impacto frequente de fortes ondas. Tal fato justificou a construção de uma nova estação, a fim de garantir a permanência dos pesquisadores na área de forma ainda mais segura e confortável.
Nesse sentido, foi aprovado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) um financiamento para a construção de uma nova Estação Científica. Em função das necessidades de projeto e a fim de atender condicionantes logísticos e financeiros, a instalação dessa nova Estação foi realizada em três etapas distintas:
- Construção das sapatas em concreto: realizada no período de 24 a 27 de julho de 2007;
- Montagem da casa: realizada no período de 26 de outubro a 05 de novembro de 2007; e
- Instalação dos equipamentos elétricos e hidráulicos: 14 a 25 de junho de 2008.
O projeto de construção foi coordenado pela SECIRM e levou cerca de dois anos para ser efetivamente concretizado. As consecutivas avaliações da primeira Estação permitiram o delineamento das diretrizes que nortearam os trabalhos, de forma que as soluções adotadas com sucesso no projeto inicial foram repetidas e, aquelas que não tiveram o comportamento esperado ou que foram submetidas a situações não previstas, foram substituídas ou aprimoradas. As etapas da construção envolveram diversas Organizações Militares da Marinha e Instituições de pesquisas:
- Comando do 3º Distrito Naval;
- Base Natal de Natal;
- Rebocador de Alto Mar Alte. Guilhem;
- Navio Patrulha Grajaú;
- Navio Patrulha Guaíba;
- Laboratório de Planejamento e Projetos da UFES;
- Laboratório de Produtos Florestais do IBAMA;
- Eletrobras Cepel - Centro de Pesquisas de Energia Elétrica; e
- EMBRATEL
Compõem a nova Estação Científica: um alojamento para 4 pessoas; sala de estar; laboratório; cozinha; banheiro; varanda; área para armazenamento de água potável; e uma edificação de apoio para o gerador de emergência e as baterias do sistema fotovoltaico. O local conta ainda, com um paiol de combustível; um píer para pequenas embarcações; e uma passarela ligando o píer à edificação principal.
A Estação é um exemplo ímpar de cooperação de brasileiros dos mais diversos setores e atividades. A prova que o Brasil trabalhando unido alcança qualquer objetivo, seja aonde for. |
A Estação Científica é ocupada por quatro pesquisadores civis que são substituídos a cada 15 dias. Embarcações fretadas pela SECIRM fazem o transporte desses pesquisadores e, para a segurança dos mesmos, permanecem nas imediações do Arquipélago em tempo integral. A Estação possui equipamentos de comunicações via satélite (Iridium), rádio (VHF e HF), internet e telefone público. Quadrimestralmente, são realizadas expedições ao Arquipélago com apoio de navios subordinados ao Comando do 3º Distrito Naval, visando efetuar a manutenção preventiva e corretiva nas edificações e equipamentos elétricos e eletrônicos.(*3).
A chegada na ilha depois de 3 dias de mar é sempre uma alegria pra quem chega e pra quem está a espera. |
A presença da Marinha do Brasil assegura a soberania e a segurança de pesquisadores e pescadores que dão apoio ao ASPSP. |
A segurança da avegação internacional é mantida pelo farol, sempre operante 24h. |
NPAOc P-122 Araguari, o cão de guarda da Amazônia Azul. |
A vista que nunca cansa os olhos mesmo dos mais antigos, contemplar esse pedaço do Brasil no meio do Oceano Atlântico é um privilégio de poucos. |
Depois do NPAOc "Araguari", os botes infláveis são o nosso principal meio de transporte para o Arquipélago. |
Segurança acima de tudo, sem a correta atracação do bote a embarcação, ninguém sobe ou desce, e, sempre todos de colete salva vidas padrão SOLAS. |
Uma das "fainas" de peso, que somente com a ajuda da Marinha do Brasil seria possível. |
Embarcação pesqueira "Transmar l" em seu período de 15 dias, e somado mais 4 de ida e 4 de volta para Natal, totalizam 25 dias de mar em suas atividades de apoio ao ASPSP. |
Comunicações; a segurança que vem do éter... Além das antenas de rádio, existem vários outros sensores de meteorologia e medições marítimas de uso dos pesquisadores. |
O único lugar do planeta aonde pode-se pisar no mesmo material do interior do planeta... |
As poças de água do mar formadas pelas ondas e marés, enfeita a ilha principal com espelhos d'água naturais e vida marinha abundante para pesquisas. |
Comunicações, aqui não é luxo, mas uma necessidade tática e para a segurança não só dos pesquisadores como para embarcações que passem pela região e necessitem de uma "ponte" de transmissão. |
Sol intenso, e mesmo com protetor solar todos voltam mais morenos! |
Atividades de mergulho sempre com apoio de botes motorizados para afastar tubarões e se necessário recolher rapidamente quem está a mergulhar. |
O distânte ponto de rocha no meio do Oceâno Atlântico que, ocupado permanentemente, nos garante aproximadamente 450 mil km² de área em nossa Zona Econômica Exclusiva. |
Foram tantas idas e vindas que perdi a conta, mas sem deixar faltar nada ou sem deixar alguém para trás. |
Pela "Amazônia Azul", navegar é preciso... Não Importa o tamanho de sua embarcação. |
Continua na 3a e última parte semana que vem...
Referências bibliográficas:
*1- Diretriz da CIRM - Comissão Interministerial para Recursos do Mar.
*2- Normas da CIRM em www.mar.mil.br/secirm/portugues/arquipelago.html#objetivo
*3- Histórico da Estação Científica do Arquipélago de São Pedro e São Paulo - Marinha do Brasil em, www.mar.mil.br/secirm/portugues/arquipelago.html#objetivo
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