Por: Yam Wanders
Seguindo o
padrão operacional da Marinha do Brasil, todos já estavam acordados às 5h e
prontos para embarque imediato, e pontualmente às 6:55 o NPaOc P-122
"Araguari" já estava suspendendo amarras e âncoras no porto da Base
Naval de Natal, e, às 07:00h (fuso Papa - hora de Brasília) já estávamos em
movimento e direcionados para a saída do estuário do Porto de Natal, com o
óbvio calor do Nordeste aplacado apenas pela brisa marítima. A passagem
pelo estuário da saída do porto de Natal é um espetáculo à parte, com a bela
vista das dunas ao norte e do Forte dos Reis Magos e a cidade de Natal ao sul.
Apesar da ausência de outras embarcações nas proximidades, a vigilância é sempre intensa, a doutrina de vigilância na Marinha é sempre eficaz, garantindo assim a segurança de todos no mar. Uma vez já todos organizados, alojados e bifados com as instruções de segurança de bordo, a viagem começa em alto mar, com a belíssima paisagem de Natal ficando para trás. As atividades no Arquipélago de São Pedro e São Paulo é um dos melhores exemplos da união da população brasileira de origens mais diversas em uma atividade que garante não apenas um "território insular" como também uma das maiores áreas do Oceano Atlântico ao Brasil.
A
missão da Marinha
O NPAOc "Araguari" ao fundo e o Pesqueiro Transmar l. |
A minha
missão: documentar tudo o que for possível para mostrar ao público interessado,
a grande missão da Marinha do Brasil e de nossos cientistas pesquisadores nessa
"faina" que beneficia direta e indiretamente milhões de brasileiros,
mesmo aqueles que nunca ouviram falar desse "rochedo" no meio do
Oceano Atlântico e que certamente jamais terão a oportunidade de vê-lo de perto
com os próprios olhos.
Mesmo sendo
aparentemente uma pequena viagem em comparação com grandes manobras navais e/ou
instalações de prospecção petrolíferas, uma missão como essa de apoio ao programa
PRÓARQUIPÉLAGO faz parte de um todo maior que é a salvaguarda da "Amazônia
Azul", uma área que abrange 3,6 milhões de km², correspondente à nossa
Zona Econômica Exclusiva, acrescida de 900 km² de plataforma continental, além
das 200 milhas náuticas, totalizando uma área de 4,5 milhões de km². Um espaço
adicional ao nosso território, que equivale à 52% do território continental,
por isso, mesmo sendo um pouco menor à área da Amazônia legal, e por esse
motivo é chamado de "Amazônia Azul".
Em resumo
na prática: A Marinha do Brasil cuida do que inicialmente é uma pequena porção
de rochas vulcânicas e uma instalação científica quase no meio do Oceano
Atlântico, e, o Brasil tem assegurado o direito de posse de uma área de
450.000km².
A proteção da Marinha do Brasil é assegurada graças à agilidade de navios de patrulha oceânicos como o NPAOc "Araguari". |
É longe?
Não!
"É
longe? Não! É muito, muito longe...
Um dos muitos e belos nascer do Sol em alto mar. |
É
importante ressaltar a localização geográfica desse pedacinho do Brasil.
Estamos falando de um conjunto único de ilhas oceânicas brasileiras localizadas
no hemisfério norte, e estrategicamente situada entre os continentes
sul-americano e africano, fato que lhe atribui uma condição única para a
realização de pesquisas nos mais variados campos da ciência, as quais
proporcionam uma maior compreensão da dinâmica dos ecossistemas insulares e
seus intrincados processos ecológicos no Oceano Atlântico."(*2)
O
transcorrer da viagem
São exatos
três dias, desde a partida de Natal até o Arquipélago de São Pedro e São
Paulo, mesmo com a breve parada na Ilha de Fernando de Noronha para recolher
mais uma das pesquisadoras integrante da equipe de cientistas que desenvolvem
diversas pesquisas em todas as ilhas oceânicas brasileiras com o apoio da
Marinha do Brasil. Entre militares e civis presentes a bordo, todos têm tempo
para se conhecerem melhor, conhecerem os trabalhos uns dos outros e participar
de importantes exercícios a bordo, como o abandono e salvatagem (será descrito
em detalhes depois), um dos mais importantes para missões embarcadas como essa
e outras que virão para todos. Missões como essa, produzem conhecimento e
material para muitas produções, com os mais diversos temas, desde a atividade
militar mais básica das "fainas marinheiras", passando pelos
treinamentos táticos e atividades estratégicas da Marinha do Brasil.
A Passagem pela Ilha de Fernando de Noronha, para a subida de mais pesquisadores que tomaram parte na expedição. |
A exceção
dos que ficaram "mareados" por algumas horas, todos podem efetuar
atividades úteis a bordo, seja apenas conversando para explicar melhor o
trabalho desenvolvido, apresentando palestras sobre as atividades das
instituições científicas, fotografando e filmando para as matérias
jornalísticas ou apenas se exercitando no convôo. Novas amizades são feitas e
pessoas incríveis são descobertas entre os tripulantes, como por exemplo muitas
praças e oficiais que participaram da missão SAR ao "Air France 447",
uma das histórias mais fatídicas da aviação, mas que por outro lado serviu para
provar mais uma vez a operacionalidade e disposição dos militares da Marinha do
Brasil quando se trata de emergências e salvaguarda da vida humana em perigo no
mar.
Também estão entre os presentes, pesquisadores e técnicos civis que lidam
diretamente com as atividades de interesse científico que são apoiadas pela
Marinha através da SECIRM, a Secretaria da Comissão Interministerial para
Recursos do mar. Foram
organizados os exercícios e treinamentos específicos das atividades embarcadas
que mantém a operacionalidade padrão das tripulações da Marinha do Brasil,
sendo elas: Briefings de segurança para destacados e civis, adestramento de
abandono, CAv (controle de avarias), Operações Aéreas embarcadas, Adestramento
de GVI/GP (grupo de visita e inspeção/grupo de proteção), exercício de
"homem ao mar" e outros diversos de adestramentos de departamentos.
Todos serão detalhados em breve, em matérias à parte.
Momento da realização de um dos exercícios de CAV no convôo do NPAOc "Araguari" |
A Estação Científica
Inaugurada
em 1998, a primeira estação científica do ASPSP teve como objetivo apoiar o
Programa de Pesquisas do ASPSP - PRÓARQUIPÉLAGO, coordenada pela Comissão
Interministerial para Recursos do Mar - CIRM. A construção mostrou-se adequada,
mesmo considerando ondas de proporções incomuns e até mesmo abalos sísmicos
(sim, um dos poucos locais do Brasil aonde acontecem terremotos!). As
avaliações permitiram aprimorar e construir uma segunda estação, concluída em
2008.
A chegada ao largo da Estação Científica das Ilhas de São Pedro e São Paulo, uma da mais isoladas do mundo. |
Para que um
pesquisador possa efetuar suas atividades no ASPSP, o projeto científico deve
passar por uma seleção de mérito científico junto ao CNPq e a Estação está
permanentemente ocupada por pelo menos quatro pesquisadores vinculados à
Universidades diversas em períodos de 15 dias. As atividades
mais efetuadas na Estação do ASPSP são; Meteorologia, Oceanografia, Biologia,
Geofísica Marinha e Engenharia de Pesca.
A atual
estação possui acomodações simples, mas bem construídas, resistentes às
intempéries das ondas, ventos e também aos abalos sísmicos frequentes, possui sistemas
de comunicação modernos para garantir a ligação com o continente ou com
embarcações, via rádio, telefonia e internet via satélite. Além de
diversos equipamentos de análises e medições, existe também um farol marítimo
dos mais importantes do Oceano Atlântico, e, o mais importante equipamento que
é um desaminizado de água do mar.
A Embarcação Pesqueira "Transmar l" que permanece em rodízio de 15 dias com a "Transmar ll" em apoio aos pesquisadores na Ilha. |
O apoio dos
marinheiros civis de Natal
Além de
militares e pesquisadores, existe também um grupo de pessoas especiais para a
história do ASPSP e o PRÓARQUIPÉLAGO, que são os marinheiros civis e pescadores
que prestam apoio à estação científica do Arquipélago São Pedro e São Paulo.
Navegam quatro dias pelo mar bravio a cada quinze dias para transportar pessoal
e suprimentos leves para a estação. Suas embarcações são fretadas pela Marinha
do Brasil para a atividade de apoio e suprimentação leve, já que assim os
custos de deslocamento de uma embarcação da Marinha são elevados e não é
conveniente do ponto de vista orçamentário que ocorra com a mesma frequência
com que são enviadas embarcações mais leves e simples.
Fretadas pela Marinha do Brasil, essas embarcações realizam a suprimentação leve e permanecem por turnos de 15 dias na Ilha à disposição dos pesquisadores. |
Temos nessa
situação o melhor exemplo de união de pessoas de diferentes origens da
população brasileira, desde homens simples do mar que até então viviam da pesca
quase artesanal, passando pelos militares da Marinha que passam a vida se
preparado para atividades mais extremas e pesquisadores civis, que
promovem a busca pelo conhecimento em um território longínquo, hostil, sem
nenhum conforto, mas todos trabalhando em prol da soberania de nosso território
marítimo e nossos direitos na "Amazônia Azul".
O histórico
do Arquipélago
O primeiro
e mais famoso deles foi o que deu origem ao descobrimento do Arquipélago,
ocorrido com a nau portuguesa São Pedro, em 1511, comandada pelo Capitão Manuel
de Castro Alcoforado, que se desgarrou da armada que partiu de Portugal em 20
de abril de 1511, a qual se dirigia às Índias, e veio a se chocar com os
rochedos. O socorro à referida nau teria sido realizado por outra da mesma
frota, chamada “São Paulo”. Daí a origem do nome “São Pedro e São Paulo”. O
primeiro registro daquela remota região em mapa data de 1529 e sua posse pelo
Brasil jamais foi contestada.
A sua
primeira citação mais famosa foi na obra "Voyage of the Beagle",
escrita pelo cientista inglês Charles Darwin, em sua viagem pelo globo de 1832 a
1836, quando o mesmo ficou muito impressionado pela absurda quantidade de
pássaros em um local tão restrito e distante do continente. Outras duas
importantes expedições que passaram por lá foram a do oceanógrafo americano
Mattew FontaineMaury em 1838 e do HMS Challenger, organizada pela Royal Navy em
1872. A partir de
1927 a Marinha do Brasil inicia esforços para a instalação de um farol para uso
marítimo e aeronáutico nos rochedos e em 1931 as obras de instalação foram
finalizadas, porém o mesmo acabou inoperante 9 anos depois, devido aos
problemas causados pela 2a Guerra Mundial.
Localização e Clima
O
Arquipélago de São Pedro e São Paulo (ASPSP) é formado por um conjunto de ilhas
rochosas localizadas a cerca de 1.000 Km do litoral do Rio Grande do Norte,
cuja área total emersa é de aproximadamente 17.000 m². As baixas altitudes e
pequenas dimensões tornaram o local um ponto crítico para a navegação, pois as
ilhas são de difícil detecção a olho nu, principalmente em condições adversas
de luz e de tempo, o que veio a provocar alguns naufrágios ao longo da
história.
O
Arquipélago de São Pedro e São Paulo (ASPSP) consiste em um conjunto de ilhas
rochosas situadas no hemisfério Norte, sobre a Dorsal Meso Atlântica (00º
55,01’ N e 029º 20,76’ W, a cerca de 1.100 Km da cidade de Natal - RN e 520 Km
do Arquipélago de Fernando de Noronha – PE). É o ponto do Brasil mais próximo
da África, distando aproximadamente 1820 Kim de Guiné Bissau. Trata-se de um
remoto grupo de ilhas, próximo à linha do Equador, que ocupa uma área emersa de
cerca de 17.000 m², cuja elevação máxima é de 18 m acima do nível do mar.
As
seguintes características são observadas no local:
- Clima
quente e úmido;
- Solo
rochoso (rochas pontiagudas e escuras);
- Ausência
de praias;
- Ausência
de vegetação de médio/grande porte;
- Relativa
violência do mar no entorno;
- Grande
possibilidade de ocorrência de abalos sísmicos; e
-
Biodiversidade rica.
Cabo Barion Oliveira e Cabo Rodolfo, ambos da marinha do Brasil, hasteando a nova Bandeira do Brasil no mastro ao lado do Farol. |
O Arquipélago de São Pedro e São Paulo; um bem Federal
Distante
cerca de 1100 km do litoral do Rio Grande do Norte, o Arquipélago de São Pedro
e São Paulo (ASPSP) é o único conjunto de ilhas oceânicas brasileiras acima da
linha do Equador, sendo composto por pequenas ilhas rochosas formadas a partir
da evolução geológica associada à falha tectônica de São Paulo. Trata-se de um
afloramento do manto oceânico que se eleva de profundidades abissais, em torno
de 4.000 metros, apresentando uma área total emersa de 17.000 metros quadrados.
A Marinha do Brasil vem em paz, mas sempre preparada para a defesa. |
- Interesse
econômico – O ASPSP está situado na rota migratória de peixes com altíssimo
valor comercial, revelando-se uma região bastante promissora para a atividade
pesqueira nacional.
- Interesse
científico – O ASPSP sempre despertou elevado interesse científico. Trata-se de
um caso raríssimo de formação de ilhas, cercadas de rica biodiversidade, que
proporciona condições únicas para a realização de pesquisas em diversos ramos
da ciência.
- Interesse
estratégico – A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos do Mar (CNUDM),
assinada pelo Brasil em 1982 e posteriormente ratificada em dezembro de 1988,
mudou a ordem jurídica internacional relativa aos espaços marítimos,
instituindo o direito dos Estados costeiros de explorar e aproveitar os
recursos naturais da coluna d’água, do solo e subsolo dos oceanos, presentes na
sua Zona Econômica Exclusiva.
No entanto, em relação ao “Regime de Ilhas”, o
artigo 121 da Convenção, em seu parágrafo 3º, afirma que: “os rochedos que por
si próprios não se prestam à habitação humana ou à vida econômica não devem ter
Zona Econômica Exclusiva (ZEE) nem Plataforma Continental”. Garantindo,
portanto, a habitabilidade contínua daquela remota região, propicia-se ao País
acrescentar a impressionante área de 450.000 km2 à sua ZEE original, o que
equivale a aproximadamente 13% de toda a ZEE brasileira ou 6% do território
nacional.
Em 2004, a
Marinha, por meio do Ofício nº 902/2004/Com3ºDN, solicitou à Gerência Regional
do Patrimônio da União no Rio Grande do Norte (GRPU/RN) as providências
necessárias à regularização junto à Secretaria do Patrimônio da União (SPU),
visando à transferência de jurisdição do ASPSP para a Marinha do Brasil,
mediante o respectivo Termo de Entrega. O referido Termo veio a ser
efetivamente assinado em 2006, pelo Almirante de Esquadra Roberto de Guimarães
Carvalho, então Comandante da Marinha, e a Sr.ª Yeda Cunha de Medeiros Pereira,
então Gerente Regional do Patrimônio da União no Rio Grande do Norte.
Referências
bibliográficas:
(*1) Além
do PRÓARQUIPÉLAGO existe também o PRÓTRINDADE, que é um programa semelhante,
mas que se ocupa exclusivamente da Ilha da Trindade e Martins Vaz, e, que
também é Administrado pela Marinha do Brasil através da SCIRM.
(*2) Trecho
do livro; Arquipélago de São Pedro e São Paulo - O Brasil no meio do Atlântico,
Danielle de Lima Viana, Fábio Hissa Vieira Hazin, Jorge Eduardo Lins Oliveira,
Marco Antônio Carvalho de Souza - Vedas Edições 2015. Publicações
da Marinha do Brasil/SCIRM/PRÓARQUIPÉLAGO
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